Ordem no caos partidário

As manifestações de junho evidenciaram uma constatação que já era conhecida no cotidiano político brasileiro: a falta de representatividade dos partidos. A situação, que tem sua origem na formatação do nosso sistema de governo, vem se agravando reiteradamente, apesar de esforços e medidas pontuais no sentido contrário.

Desenhado para o parlamentarismo, o sistema político brasileiro acabou tendo de adaptar-se ao presidencialismo, que foi escolhido pela população no referendo de 1993. O resultado foi uma mistura entre o modelo americano, que privilegia o bipartidarismo e, portanto, estabelece claramente o que é situação e oposição, fortificando os partidos, e o modelo europeu, onde a pluralidade partidária se adequa à formação de coalizões de governo.

No Brasil, infelizmente, o somatório disso apenas herdou os vícios de ambos os sistemas. Ficamos no limbo. O presidente eleito não conta com um partido grande o suficiente para lhe dar sustentação no parlamento. Ele precisa, então, socorrer-se de outros, montando amplas alianças, quase nunca programáticas. Pelo contrário: quase sempre pragmáticas. O mesmo vale para os governos estaduais e municipais.

Mais partidos não significam, necessariamente, melhor democracia e mais representatividade. O caso brasileiro demonstra isso. Nosso sistema, viciado desde a origem, propicia partidos de aluguel, acesso irrestrito ao fundo partidário (composto por recursos públicos) e, salvo exceções, desprezo às ideologias. O ambiente é de tal modo extravagante que mesmo iniciativas plausíveis, como a criação da Rede Sustentabilidade pela ex-ministra Marina Silva, acabam figurando como mais do mesmo. A virtude não consegue destacar-se no meio de um círculo vicioso.

Medidas como a cláusula de barreira e a verticalização das alianças tentaram, a seu tempo, dar alguma organização para esse quadro partidário caótico. Ambas foram infrutíferas por se constituírem de atos isolados. É preciso mais do que isso. Sem um amplo processo de debate do nosso sistema político não se construirá uma solução de longo prazo para esse problema. Continuaremos tratando de perfumarias enquanto não formos ao cerne, às causas, ao nascedouro de todas essas contradições.

A reforma política, sempre adiada, nunca discutida, é o único modo de estabelecermos critérios para criação de agremiações e a fortificação da nossa representação partidária. Enquanto não tomarmos esse rumo, os partidos que ainda condensam algum diálogo real com a população continuarão a desidratar-se. E aquelas as legendas novas e que possam ter boas intenções, sofrerão preconceito advindo de nosso atual quadro corrompido. Já as que existem para figurar como mero balcão de negócios continuarão obtendo os lucros que desejam. É preciso dar um ponto final nesse desvirtuamento.

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