É hora de resgatar a indústria nacional

A desindustrialização é um processo gradativo e praticamente silencioso. Trata-se da perda de competitividade dos bens brasileiros frente ao mercado global. Da troca do produto nacional pelos importados. Da ociosidade e da diminuição dos nossos parques fabris. Da incapacidade de agregar valor aos insumos que nos são disponíveis. No curto prazo, todo esse processo é visível apenas pelas próprias indústrias e pelas entidades que lideram o setor. Seus efeitos, porém, são como de um cupim: quando eclodem, geram a ruína de uma empresa, depois de outra e assim sucessivamente. Inicia uma reação em cadeia que atinge todo o ambiente econômico.

Tenho alertado insistentemente sobre isso, seja aqui ou em todos os espaços que ocupo. Chegamos a uma situação absurda, sem a reação proporcional que tamanho perigo exige. Basta ver que, segundo o último Índice de Confiança do Empresário Industrial (Icei), o empresariado continua cada vez mais descrente sobre os rumos da economia e dos seus próprios negócios. A apuração, feita pela Confederação Nacional da Indústria (CNI), chegou aos seus patamares mais baixos desde que começou a ser feita, no ano de 2000.

A área da indústria de base e de bens de capital, segundo a Abimaq, apresenta maior pessimismo. E quando a “indústria de fazer indústria” aponta esse esgotamento, o cenário muito provavelmente tende a agravar-se. Se a situação não está bem nesse setor, é quase automático que os demais comecem a demonstrar igual sofreguidão. A participação da indústria de transformação no Produto Interno Bruto (PIB) retrocedeu ao nível que o setor tinha em 1955, antes da implantação do Plano de Metas de Juscelino Kubitschek. É sinal de que as empresas estão deixando de comprar equipamentos para seus processos fabris, isto é, pararam de investir e de ampliar seus negócios.

Há outro dado concreto e preocupante nesse cenário. A participação da indústria nas exportações está diminuindo. Isso mostra que continuamos calcados tão-somente nas commodities. Que bom que elas existem, mas estamos perdendo a oportunidade de exportar produtos com maior valor agregado, os quais envolvem o uso de tecnologia. Estamos levando produtos in natura para fora – e o industrial de outro país está ganhando o maior lucro com ele.

A nossa balança comercial, apesar do superávit, teve em março seu pior resultado trimestral desde 2001, um saldo negativo de US$ 6 bilhões. E o Brasil é vítima nas duas pontas: cerca de 86% das compras do país são de produtos industrializados. Em outras palavras, são bens importados que já chegam prontos para a prateleira do consumo.

Nunca fui alarmista, mas não podemos ser irresponsáveis. A indústria brasileira está sendo empurrada para baixo. O aumento de juros começou a ser sentido desde o segundo semestre do ano passado. As medidas de incentivo pontuais pararam de surtir efeito no consumo interno. O temor da inflação retém todo o mercado. O programa Reintegra, que devolvia 3% do faturamento para ressarcir tributos cobrados indevidamente, foi extinto. O Custo Brasil segue entre os maiores do mundo, causando prejuízos reais. Nossa velocidade de manobra nos acordos comerciais é sôfrega, bem como nossas medidas de proteção.

É hora de uma reforma estrutural. Não podemos continuar na rotina de uma a outra medida pontual, como se um problema tão grave pudesse ser tratado com curativos. Para começo de conversa, o país ainda não possui um verdadeiro plano industrial. Enquanto a China já planejou três décadas para frente, aqui não está claro o que queremos para o ano que vem, quanto menos para a próxima década. Estamos praticamente à deriva, sustentados muito mais pelo esforço do setor do que por qualquer espécie de política. Ou salvamos nossa indústria, ou o país corre risco junto com ela. Não se trata de um favor, mas de uma obrigação para com a sustentação econômica e social da nação.

 

Notícias Relacionadas

Os comentários são moderados. Para serem aceitos o cadastro do usuário deve estar completo. Não serão publicados textos ofensivos. A empresa jornalística não se responsabiliza pelas manifestações dos internautas.

Deixe uma resposta

Você deve estar Logando para postar um comentário.