Queda de juros: reiterados motivos

Escrevi, há alguns dias atrás, logo depois do anúncio da redução da Selic pelo Banco Central, que os motivos para tal decisão eram justificadíssimos. Apontei que a única reação contrária vinha de “financistas” ligados ao capital especulativo, os quais se apressaram em lançar críticas com poucos fundamentos à medida. Recordei que, enquanto o Brasil fixava em 12% sua taxa básica de juros, em países como Estados Unidos, Japão e os europeus esse índice não passa de 1%. Analisei os cenários interno e externo para constatar que a crise global estava só no começo e que, inevitavelmente, respingaria por aqui. Era preciso reagir, pois, lançando mão da política monetária.

Recupero esse contexto para reafirmar as mesmas convicções e, depois de alguns dias, projetar que a tendência de queda terá de ser seguida nas próximas reuniões do Copom. Não por desejo ou motivação política, mas pela simples imposição da própria realidade. A crise recrudesce e a capacidade de reação dos países mais diretamente atingidos é menor do que outrora: além de já estarem endividados, suas contas estão comprometidas com altos déficits. No ambiente local, a queda de 36% no nível de geração de emprego em comparação ao ano anterior [dados de agosto] é um indicador suficiente, dentre tantos disponíveis, para apontar o desaquecimento da economia brasileira.

Os fatos se sobrepõem na mesma direção. Um dos mais recentes mostra que o sistema financeiro europeu continua desregulado e sem controles eficientes: o banco suíço UBS anunciou um rombo de 2 bilhões de dólares em suas contas e dois bancos franceses tiveram suas notas de risco rebaixadas. Nos EUA, o patamar de descontrole não é diferente. Consolida-se, diante de tudo isso, a avaliação de que a instabilidade e o pessimismo predominante nas decisões bancárias, empresariais e dos consumidores levarão a um crescimento baixo e declinante dos países desenvolvidos ao longo deste ano, isso para ficar na previsão mais otimista.

Outro aspecto, dessa vez interno, invoca um contra-argumento que precisa ser desconstituído: o risco de inflação. O Copom e o Banco Central já vinham dizendo, tanto em suas atas oficiais quanto através da manifestação de suas autoridades, que o aumento de preços deveria chegar a seu pico no final do mês de setembro e começo de outubro. Logo, as últimas elevações inflacionárias, e as que porventura ainda poderão ser apontadas nos próximos dias, não decorrem da diminuição da taxa básica de juros. Elas já compunham um cenário previsível e haverão de arrefecer, ao natural, com a ampliação dos efeitos da crise.

É verdade que o Brasil sinalizou uma mudança cultural com a recente redução da taxa Selic – e fiz questão de saudar o presidente do BC, Alexandre Trombini, por romper a barreira do conservadorismo e segurar o rojão das críticas. Não podíamos continuar na lógica dos juros estratosféricos apenas sob a pauta de alguns financistas e engessados por preciosismos retóricos da especulação. Mas, além disso, a decisão do Copom foi absolutamente técnica, madura e firmada em acontecimentos reais. A propósito: a Turquia, que já fora campeã mundial de juros, inverteu essa tendência – entre 2008 e 2009, o país baixou sua taxa básica de 16,75% para 6,5% ao ano – sem abalar seus padrões macroeconômicos e sem comprometer sua meta de inflação. O Brasil, diante dos novos motivos que surgem, precisa seguir nesse mesmo rumo.

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