Santa Casa 100% SUS Porque não apoio essa ideia

Há certo tempo que correm comentários a respeito de transformar a Santa Casa de Livramento num Hospital exclusivo do SUS, uma possível alternativa para resolver problemas crônicos, principalmente a insuficiência de recursos financeiros para sua sustentação.
Como membro do corpo clínico, tenho acompanhado de perto a trajetória da Santa Casa nos últimos 30 anos. Ocupei cargos de chefia no Pronto Socorro e Bloco Cirúrgico. Fui Diretor Clínico e Diretor Técnico, e fiz curso de Pós-graduação em Administração Hospitalar. Atualmente faço parte da Mesa Administrativa e da Comissão de Ética e coordeno o Departamento de Cirurgia. Vivenciei o surgimento do SUS, sua implantação e suas mudanças e sempre atendi seus usuários. Conheço o sistema e seus problemas, pois estou na linha de frente e vivo diariamente e intimamente as dificuldades enfrentadas, tantopor quem necessita resolver problemas de saúde como por quem presta os serviços, já sejam médicos e demais profissionais da área, ou Hospitais, laboratórios, serviços de diagnóstico, etc.
Creio que tudo isto me credencia a dar uma opinião consistente a respeito desse assunto: sou contra a Santa Casa transformar-se num Hospital exclusivo do SUS, e vou apresentar os principais motivos que me levam a pensar assim.
A Santa Casa de Livramento é um Hospital da rede filantrópica do Brasil, surgida no fim do século XIX como cópia dos Hospitais filantrópicos de Portugal. Foi construída com recursos arrecadados pela comunidade local enum terreno doado por uma família santanense.Durante muitas décadas foi mantida, reformada e equipada com recursos também da comunidade, muito antes de surgirem os planos de saúde e o SUS.
A crise financeira da rede de hospitais filantrópicos do país instalou-se aos poucos a partir da década de 80, basicamente por insuficiência de recursos e gestões administrativas não profissionais. A recuperação dos Hospitais ainda está em andamento, alguns fecharam as portas, outros procuram ainda o difícil equilíbrioeconômico, como é o caso da nossa Santa Casa, e alguns poucos conseguiram desenvolver-se, geralmente nas capitais de Estadoalavancados pelo apoio de grandes grupos empresariais, como é o caso da Santa Casa de Porto Alegre.
Hoje, a Santa Casa de Livramento mantém-se, com dificuldades, com recursos obtidos pela prestação de serviços ao SUS, repassados pelo Estado e Município, e recursos do SISPREM, UNIMED, CASSI, FUSEX,ASSEFAZ e outros convênios, assim como de particulares e de algumas campanhas de doação de recursos como da AES SUL, rede Panvel, Supermercados Righi e outras campanhas eventuais como a da Acil, recentemente realizada.
Transformar a Santa Casa exclusiva para o SUS significa então fechar as portas aos usuários dos convênios mencionados, que consistem em todo o Magistério Estadual, a Brigada Militar e o Corpo de Bombeiros, a Polícia Civil, o Exército Brasileiro, a Área Judiciária Estadual e Federal, os bancários, os funcionários públicos municipais, empresas conveniadas e usuários da Unimed e tantos outros. Significa também abrir mão da receita desses convênios.
Acrescento ainda que não há falta de leitos para o SUS na nossa cidade. Não há fila de espera para internação hospitalar. E já existe verba aprovada pelo Senhor Governador Tarso Genro para reforma da antiga enfermaria, ampliando o número de leitos e preparando a Santa Casa para o futuro.

Recentemente, o nosso Provedor, Dr. Carlos A. Viera esteve na Sec. Estadual de Saúde para informar-se a respeito do assunto e retornou convicto que não é uma boa alternativa.
Os Hospitais 100% SUS continuam com os mesmos problemas. Diariamente acompanhamos na mídia imagens revoltantes que acontecem em todos os cantos do país.
Hospitais modelos de atendimento no nosso Estado, como a Santa Casa de Porto Alegre e o Hospital de Clínicas não são exclusivos do SUS. Ali, a tecnologia de ponta é usufruída por todos, não importa o convenio.Se transformar a rede filantrópica do país em Hospitais exclusivos do SUS fosse uma boa solução, haveria uma corrida desses hospitais nesse sentido, e não é isso que observamos no momento.
Todos nos preocupamoscom os problemas da saúde do nosso município e queremos que as coisas melhorem. Há muito por fazer e os atuais gestores têm demonstrado que conhecem os problemas e os caminhos a seguir. Devemos ser parceiros na busca das soluções. Defendemos o diálogo e a soma de esforços. Somos receptivos a críticas construtivas. Os problemas devem ser corretamente equacionados e as possíveis soluções procuradas dentro de critérios técnicos, e que obedeçam a legislação vigente.
Finalmente, repito aqui uma frase do Senhor Prefeito Municipal, dita recentemente em entrevista a uma radio local. Considero-a muito significativa, pois reflete muito aquilo quepenso: “vamos parar de nos morder o rabo”… É isso mesmo. Todos os setores e segmentos da sociedade, toda a comunidade santanense enfim, deve unir esforços em busca da Santa Casa que queremos. As agressões não levam a nada positivo.
Eu também quero uma Santa Casa melhor, mas para todos.
100% SUS não.
Carlos de Moura Lliviria
Presidente da Associação Santanense de Medicina

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