Partidos em excesso: o que está ruim pode ficar pior

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), há 30 partidos registrados no Brasil atualmente. A constatação, que pode mudar a qualquer momento, é desta segunda-feira Outros 31 estão em vias de formalização. Ou seja: o número poderá dobrar nos próximos anos a se confirmarem todos os processos que estão em andamento, afora outros que ainda podem surgir.

Parece contraditório, mas essa tendência aumentou exponencialmente a partir de uma medida motivada por bons propósitos: em 2007, a Justiça restringiu a mudança de agremiação para combater a infidelidade partidária. Porém, ao mesmo tempo, interpretou que o ingresso em uma nova sigla não se enquadra em tal hipótese. Quem muda de legenda para outra já existente tende a perder o mandato. Já quem entra numa recém-criada preserva intacta sua situação.

O precedente contemplou aspirações legítimas, mas abriu brecha para diversos oportunismos. Ouvidos pela imprensa, líderes confirmam grande interesse de parlamentares de diversos estados por futuras siglas. Embora não estejam oficializadas, elas são vistas como meio de manobra para favorecer aspirações meramente pragmáticas. Muitas têm boa intenção; outras, no entanto, já são criadas justamente como moeda de troca. Têm donos, chefes e gerentes. Um vergonhoso balcão de negócios – a verdade precisa ser dita.

Incide nesse contexto o acesso ao fundo partidário. Mesmo sem representatividade na Câmara ou no Senado, as novas legendas podem usar o recurso. Fazem gestão do dinheiro público sem passar por eleição, concurso ou qualquer espécie de seleção. São verbas do Orçamento da União, que no ano passado totalizaram R$ 350 milhões. O partido que menos recebeu teve um crédito de R$ 605 mil.

O risco evidente se amplia com a possibilidade de transformar o Congresso Nacional numa verdadeira concha de retalhos de pequenos grupos de pressão, maior do que já é atualmente. A profusão de siglas sem representatividade tende a ampliar a confusão no cenário político brasileiro, tornando ainda mais complexo – e perigoso – o arranjo de forças para governar dentro do nosso sistema presidencialista de coalização. Formar maiorias estáveis é missão cada dia mais difícil, bem como colocar em curso uma pauta produtiva e sintonizada com os interesses da nação.

Essa contradição depõe também contra a credibilidade das nossas instituições – os partidos, inclusive. Não há ideologia suficiente para abrigar tanta pretensão. Dos extremos da direita à esquerda, das multiplicidades do centro, das tendências conservadoras às progressistas, enfim, nem a reunião de todos os pensamentos políticos consegue distribuir-se em três dezenas de siglas diferente. Imagine-se em seis dezenas! Isso desmotiva quem queira servir e acreditar na nação. Afasta bons quadros da política.

Precisamos encontrar um equilíbrio nesse cenário – uma reforma partidária e eleitoral. Nossa democracia não pode ser estanque a ponto de proibir a formação de frentes políticas. É necessário dar margem para que as forças sociais se articulem e abram novos partidos. Trata-se de uma legítima liberdade de organização. Porém, isso não pode ocorrer sem critério e de modo a subverter o mecanismo. Há que se montar um parâmetro capaz de equilibrar o direito de abrir uma agremiação com a segurança de um sistema mais coerente e menos volátil.

Mesmo que muitas vezes sejam criticados com razão pela opinião pública, os partidos devem ser prestigiados e qualificados em sua função republicana. Para isso, precisam ser orgânicos e representativos. A história já provou a íntima ligação entre a democracia e os partidos – no Brasil e em diversos países do mundo. Mas não podemos permitir que, sob esse pretexto, novos escândalos acabem ocorrendo, devido às distorções do atual sistema partidário

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