O grande debate das questões federativas

Circunstâncias pós-eleitorais, políticas e econômicas conduziram diversas questões federativas para o centro da pauta brasileira. A dívida da cidade de São Paulo, levantada pelo prefeito eleito Fernando Haddad, é apenas um dado a compor o mosaico de contradições existente na relação entre os nossos entes federados. Todas as evidências dão conta de que chegou a hora de colocar em prática pelo menos algumas modificações importantes. E o sinal de que existe ambiente para isso já foi dado por altos escalões do governo federal.

O endividamento dos estados e municípios está, de fato, entre as questões mais gritantes e urgentes. Quando fui governador, expus as dificuldades que isso causava. Lutei sem descansar pela reversão do quadro, apoiado por outros líderes do Rio Grande do Sul e do Brasil. Alguns críticos chamavam a atitude de “choro”. Agora se vê que era questão de justiça, tão-somente, e de uma luta que precisa unir a todos.

O acordo de rolagem, ocorrido no final dos anos 80, foi adequado para as condições de então. Mas a realidade mudou: o juro cresceu e a dívida subiu com ela; a inflação caiu e a arrecadação estadual desceu com ela; o indexador de atualização – Índice Geral de Preços-Disponibilidade Interna (IGP-DI) e mais 6% – hoje não é usado sequer pelo próprio governo para o financiamento privado. Em 1987, quando o débito foi repactuado, o Estado devia R$ 11 bilhões. Até 2010, pagou R$ 18,7 bilhões. Porém, ainda deve R$ 40 bilhões. É uma explícita disparidade.

Nesse mesmo contexto, é preciso reavaliar o índice de comprometimento da receita dos estados para pagamento da dívida. Sobre isso, propus ao então ministro Berzoini que o valor desobrigado migrasse para um fundo previdenciário a ser criado. Tal medida ajudaria a aliviar esse outro grande gargalo nas contas públicas. Não se avançou, porém.

A distribuição dos royalties do petróleo é mais uma matéria relevante a ser apreciada em breve. A atual regulamentação já é equivocada, pois privilegia os estados produtores. No pré-sal, isso se evidencia ainda mais: as reservas ficam a cerca de 300 quilômetros da orla e estão de 5 a 7 mil metros abaixo do nível do mar. Ora, estamos diante de uma riqueza da Federação brasileira, desenvolvida através da Petrobras, cujos benefícios precisam ser repartidos igualitariamente entre a nação.

Também se impõe a necessidade de unificação das 27 legislações de ICMS, mudando gradativamente a cobrança da origem para o destino e reduzindo a guerra fiscal. Os incentivos para atração de investimentos poderiam vir de um fundo com critérios claros e transparentes. Com responsabilidade, podemos superar o império da insegurança dos contratos e das batalhas jurídicas. Um novo marco legal suplantaria tais problemas.

Todos esses pontos têm como pano de fundo o pacto federativo e a necessidade de sua atualização. É uma oportunidade singular para encontrar um novo equilíbrio entre os entes federados e resolver questões cruciais que repercutem no cotidiano dos cidadãos. A transformação pode ser gradativa, mas precisa começar agora.

 

 

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