Ferrovias: é preciso fazer acontecer

A economia deu sinais esparsos de melhora na última semana, mas o acumulado do ano demonstra que teremos um crescimento muito baixo em 2012, bem menor do que as expectativas traçadas para o período. As greves no setor público federal são mais um elemento de instabilidade no cenário atual. O governo, que já tem alto comprometimento com o gasto público, está numa encruzilhada. Enquanto isso, na Europa, o epicentro da crise internacional, ainda não é possível notar um claro caminho de recuperação. 

Essas e outras circunstâncias justificam o entusiasmo com que foi recebido o pacote anunciado pela presidente Dilma na última semana, que estimula investimentos privados no setor de infraestrutura, especialmenteem ferrovias. Amobilização econômica que isso tende a gerar terá um efeito difuso importante no contexto da crise. Além disso, age pontualmente no problema modal brasileiro, excessivamente concentrado em rodovias. 

O projeto é realista. O Estado reconhece que não tem capacidade de investir e tampouco gerir um sistema ferroviário mais amplo. E sequer tem expertise para isso. Não se trata de uma discussão ideológica, apenas de uma evidência dos fatos. Se fôssemos esperar pela capacidade do poder público, as estradas de ferro continuariam sendo tão-somente mais uns daqueles sonhos de verão. 

Infelizmente, ao longo dos tempos, o Brasil perdeu o rumo da história em relação às ferrovias. Nosso caminho foi de involução. Muitas cidades ainda têm as estações que outrora serviam para transporte de passageiros. Mas, gradualmente, com o foco se voltando ao automóvel, os governos deixaram de cuidar dessa importante alternativa – ao contrário do que fizeram os países mais desenvolvidos. No governo FHC, a privatização do setor não deu certo, pois as empresas credenciadas para explorar o serviço não conseguiram cumprir suas obrigações. 

A tentativa da presidente Dilma vem em outro tempo e com outra configuração: a de parceria público-privada. O governo vai contratar a construção, a manutenção e a operação da ferrovia. A Valec, empresa pública, compra a capacidade integral de transporte da ferrovia e faz a oferta disso, assegurando o direito de passagem dos trens em todas as malhas. A venda de capacidade será feita para usuários que quiserem transportar carga própria, para os operadores ferroviários independentes e para os concessionários de transportes ferroviários. 

O pacote integral de concessões vai trazer investimentos de R$ 133 bilhões nos próximos 25 anos. Serão concedidos para a iniciativa privada 7,5 mil km de rodovias e 10 mil km de ferrovias. Do total de investimentos, R$ 79,5 bilhões serão investidos já nos primeiros cinco anos. Para as rodovias, o total investido será R$ 42 bilhões e para as ferrovias, R$ 91 bilhões. O programa ainda prevê concessões para portos e aeroportos, que serão detalhadas nas próximas semanas. 

O anúncio abre uma bela perspectiva. Porém, deve ser acompanhado de agilidade nos procedimentos administrativos, tais como licenças ambientais, projetos de viabilidade técnica e todas as burocracias que antecedem a assinatura do contrato e o início da operação. É preciso que o cronograma previsto pelo governo seja cumprido, diferente da lerdeza com que esses processos costumam ocorrer no país. Se tudo andar conforme se pretende, não resta dúvida de que, depois de tantos anos, terá começado a ocorrer uma gradual recuperação da tradição ferroviária brasileira.

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