O valor intangível do CDES

Vivemos num tempo civilizatório em que os modelos totalizantes perderam o seu vigor e seu papel determinante na história. O contexto de pós-modernidade, presente na literatura e nas teorias acadêmicas, onde as verdades revogam o seu caráter absoluto e se afirma a flexibilidade dos conceitos e a diversidade das culturas e valores, parece compor o universo simbólico contemporâneo.
O que são mesmo os tempos pós-modernos? Parece que o próprio sentido de tempo é diferente de outras épocas. O ritmo é mais intenso, as coisas são descartáveis, as aparências subordinam as essências, os sentidos se esgotam no presente e os resultados imediatos e objetivos desprestigiam a importância dos processos e valores simbólicos.
A constatação de que o RS é marcado por uma cultura de polaridade muitas vezes de natureza belicosa é reconhecida tanto no senso comum quanto entre os pesquisadores da história gaúcha. Esta postura tem gerado descontinuidades em muitas áreas, principalmente nas políticas de desenvolvimento, equidade e bem estar.
Embora a participação da sociedade civil nas decisões sobre as políticas públicas tenha sido uma constante nos governos democráticos e populares nos últimos tempos, os processos participativos são muitas vezes contaminados pela lógica dos vencidos e vencedores, das maiorias sobre as minorias. As relações instrumentais e as posturas corporativas, em vários casos, subordinam uma leitura mais universal e solidária sobre os problemas dos que mais necessitam das políticas e ações do Estado.
O governador Tarso Genro propõe uma inovação com a criação do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. O CDES se diferencia das práticas democráticas anteriores na sua composição, metodologia e processo de decisão. A composição por indivíduo em vez da entidade não prejudica a sua representatividade. A diversidade no perfil dos conselheiros, expressa nas diferentes visões de mundo, afirmam a sua pluralidade e seu caráter republicano.
A grande inovação, no entanto, é a metodologia no processo decisório que não se dá pelo voto, mas pela busca de definições coletivas pela ação argumentativa para produzir resultados por consenso. Este método incide no sentido inverso desta cultura dicotômica e muitas vezes beligerante de nossa tradição. Este é um valor intangível do CDES nem sempre considerado.
De forma recorrente o CDES é questionado por setores conservadores para apresentar resultados objetivos e concretos. O programa de Irrigação Mais Água – Mais Renda, as diretrizes para o novo modelo dos pedágios, a constituição do Conselho Deliberativo Metropolitano são exemplos práticos entre as mais de 120 sugestões acolhidas pelo governo em diferentes áreas no primeiro ano e meio de funcionamento.
Contudo, as conquistas simbólicas de uma cultura mais unitária, o esforço da construção coletiva pelo argumento, a convivência civilizada e construtiva de indivíduos com visões de mundo até antagônicas, mas imbuídos de um sentido comum pelo Rio Grande, não têm ainda o devido reconhecimento do seu valor.
Nestes processos históricos, onde a busca de novos sentidos inquieta as consciências e desafia os povos, é que valorizo este modo de operar do CDES. Sua metodologia, na pequena escala local, contribui de forma embrionária para uma cultura mais solidária e cidadã.

Maria Eunice de Andrade Araújo *
* Assessora do CDES-RS

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