A herança cultural da Rio+20

A Rio+20 terminou e o principal debate que remanesce é sobre o alcance do seu documento final. Há dúvidas se o texto teve a profundidade esperada pela maior parte dos ambientalistas. Mais: diversos países não materializaram um comprometimento concreto através de metas objetivas. Discursos parecem desproporcionais às ações. Trata-se de uma apreciação oportuna, mas que não pode ser a única a vigorar.

O resultado da conferência vai muito além de suas discussões políticas e técnicas. O Brasil cresceu ainda mais no contexto internacional, reafirmou sua vocação de player global. Mas há um bem intangível que, necessariamente, o evento reforçou junto à sociedade brasileira e mundial: o estímulo a uma mudança cultural. Colocar a questão ambiental no centro da pauta das nações é algo proveitoso em si mesmo – já pelo próprio debate que gera, pela reflexão que estimula.

A lógica da sustentabilidade está inaugurando um novo marco moral no elenco de valores dos indivíduos, das famílias, da sociedade, das empresas e dos governos. Essa é a grande novidade para a qual a Rio+20 empresta excepcional colaboração. Estar atento à preservação ambiental, no cotidiano da vida, é um convite que a atualidade faz a quem se pretende responsável com o presente e o futuro. A quem respeita o próximo e o planeta em que habita.

E aí entramos até mesmo no terreno das coisas mais comezinhas do cotidiano do lar, mas com sólida importância, tais como não jogar sujeira na rua, separar o lixo reciclável, não desperdiçar água, reaproveitar móveis, papéis e alimentos, exercitar um consumo responsável e dialogar com os filhos sobre esses contextos. Mas também a aspectos mais abrangentes, como políticas públicas de preservação, saneamento básico, transporte coletivo e educação.

Esse novo padrão de comportamento passa ao largo de exageros, sectarismos, militâncias e fanatismos. Trata-se, justamente porque falamos do terreno da moral humana, de uma adesão conscienciosa, livre e virtuosa em favor de um mundo sustentável. Isso significa congregar progresso, avanço econômico e inclusão social com respeito ao meio ambiente, à qualidade de vida e ao ser humano. Diz também com o cultivo do belo, no sentido de um novo olhar para a natureza de que dispomos. Um olhar que se apropria da contemplação e a transporta para o terreno da cultura.

Por isso mesmo, essa consciência pressupõe a adesão e a iniciativa individual. Não só porque a lei manda, outros dizem para fazer, é politicamente correto ou por mera estratégia de imagem. Mas sobretudo porque a sustentabilidade foi assimilada como valor. Tal absorção implica gestos nos hábitos pessoais, na gestão dos negócios, no desenho das cidades, na arquitetura das construções, no tratamento com os mais diferentes legados. Mas tudo parte do ímpeto, livre e decidido, para agir sob inspiração desse novo vetor do nosso tempo.

A sustentabilidade não pode ser apenas clichê, política, palavra de ordem, imposição ou mote para proselitismo. Precisa ser prática incorporada, fruto do juízo e da postura responsável. E ela terá cada vez mais esse sentido quanto mais perto estiver das pessoas, de suas consciências, decisões e atitudes. E, nessa direção, mesmo com as dissonâncias naturais a um encontro desse porte, a Rio+20 emprestou uma valiosa contribuição cultural.

 

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