Argentina: os Jogos Olímpicos começaram nas Malvinas

Esta semana causou forte impacto na mídia nacional e internacional o audaz spot publicitário, patrocinado pelo Governo Argentino, no qual aparece um jogador da seleção de hockey treinando nas Ilhas Malvinas, com o sugestivo recurso emocional: “treinando em solo argentino para ganhar os Jogos Olímpicos da Inglaterra”.

Sem discutir a qualidade estética publicitária do spot, e o evidente golpe de efeito que produziu nos corações argentinos, não resta dúvida de que se trata, novamente, igual que na nacionalização da petroleira YPF (semana passada) um ato de claro oportunismo político.

No debate sobre a expropriação da petroleira e na obsessiva reivindicação pelas Ilhas Malvinas, fora as questões jurídicas comprometidas e da fragilidade gratuita que expõe à Argentina, espantam pela obediência cega e uníssona de toda uma nação diante de atos irresponsáveis e de aberto conteúdo midiatico.

É surpreendente, e difícil entender, como uma nação inteligente e culta, como inegavelmente é a Argentina, embarca de repente em aventuras nacionalistas desta laia que historicamente tem-se revelado como artimanha de ardil político: que justifica ditaduras, que aprova moratória, que reivindica soberanias sobre terras que não lhes pertencem, e que os joga pateticamente a uma guerra humilhantemente perdida.

É inadmissível que uma nação inteira entra no embuste coletivo, embalado no discurso fácil, cujo propósito todos sabem (e os argentinos também) não é outro senão distrair a atenção sobre os reais problemas que assolam um país rico, inexplicavelmente empobrecido.

Uma nação que até princípios do século XX era quinta economia do mundo, que atraiu o sonho de milhares de emigrantes europeus para uma ilha de civilização e prosperidade. Neste período, e durante 30 anos a economia argentina cresceu a uma taxa média de cerca de 8% ao ano, a renda per capita dos argentinos era quatro vezes maior do que a renda dos brasileiros, e o dobro dos norte-americanos. O salário médio em Buenos Aires era de até 50% superior ao de Paris. O PIB argentino era maior ao da maioria dos países europeus, similar ao da França e da Alemanha, e maior do que Itália e o Japão.

Mas afinal, o que aconteceu com esse mar de prosperidade? Onde um terço dos argentinos viviam na luxuosa Buenos Aires, uma cidade sofisticada e culta; durante muito tempo considerada a capital européia da América Latina. Por que um país que faz 100 anos era considerado um dos dez mais ricos do planeta, hoje peleja para sustentar o lastimável 66º lugar no ranking do Banco Mundial?

Jamais tamanha riqueza foi esbanjada com tamanha irresponsabilidade em nome do Estado providencial fundado pelo peronismo justicialista. Essa espécie de partido único que comanda a mais 70 anos a vida política argentina e que se nutre dilapidando o rico patrimônio nacional para sustentar, no voto adquirido, a preço de medíocres planos assistencialistas patriótico-eleitoreiros. O trânsito da riqueza à pobreza, talvez possa ter outras razoes, próprias e alheias, mas esta com certeza é uma delas.

“Solo el Peronismo es capaz de gobernar la Argentina” esta frase, que reina soberana e define todas as eleições na Argentina, quem sabe explique a superstição ideológica que conduz inexoravelmente o mesmo partido político a ocupar a casa Rosada. O Estado forte é a lógica que justifica estes devaneios patrioteiros nacionalistas do Peronismo, contraditório e incoerente, que mistura todas as ideologias, e afinal não responde a nenhuma delas. O estado justicialista dono da abundância, da vida, da miséria, e, claro, também do voto.

É visível, agora também a grande contradição que rodeia toda essa abundância desperdiçada, privatizada e nacionalizada pelo mesmo partido (de Menen e Kirchner).

Resulta irônico então, nestas marchas e contramarchas, que essa mesma fortuna tenha sido a causa também de suas desgraças. De suas crises políticas intermináveis, de seus desgovernos, de suas debilidades institucionais e da corrupção invencível que se multiplica anestesiando uma sociedade que parece perdeu todos os reflexos para reagir contra o populismo que deforma e degrada um dos Estados mais ricos do mundo.

Leonardo Araújo

Prof. Direito Internacional

 

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