A distorção das emendas individuais

Instrumento utilizado para destinar recursos aos municípios à escolha de cada parlamentar, as emendas individuais ao Orçamento da União deveriam contribuir com a saúde financeira das nossas comunidades. E, de fato, quando fui congressista, comprovei que muitos resultados positivos surgem de uma verba aplicada adequadamente. Contudo, muitas vezes o que se vê na prática costuma ser justamente o oposto. Tal prerrogativa tem dado margem ao clientelismo e ao fisiologismo, comprometendo a relação entre Congresso e Executivo e desequilibrando os elementos da federação.

Geralmente, as emendas individuais têm sido distribuídas a partir de critérios meramente políticos. Com o objetivo de valorizar a própria imagem diante de sua base eleitoral, muitos parlamentares destinam recursos públicos de maneira pragmática, privilegiando investimentos em localidades que podem render-lhe votos. Sem análise de prioridades, sem maiores considerações. 

Além disso, a liberação das emendas necessita da aprovação do Executivo, o que cria um círculo de dependência e enganações. Recursos são prometidos e, posteriormente, acabam não sendo disponibilizados. Não raras vezes, o parlamentar anuncia que destinou uma verba, mas o dinheiro propriamente dito nunca chega à comunidade. E também prepondera o critério político: governistas costumam ter mais emendas liberadas do que oposicionistas – situação que não se restringe à atual gestão, senão que se trata de uma prática comum também em mandatos anteriores.

Tal situação é mais uma das contradições da Federação brasileira, que concentra recursos na União e transforma Estados e municípios em reféns de repasses e fundos externos. Nossos prefeitos e governadores acabam recorrendo às instâncias federais como se estivessem pedindo um favor, sobretudo em momentos mais urgentes – como no caso dos recentes desastres naturais que acometeram diversas cidades em todo o país. Veja-se: o dinheiro que saiu do caixa sem critério faz muita falta na hora de uma necessidade real.

As distorções provocadas pelas emendas individuais, portanto, evidenciam a necessidade urgente de uma mudança no atual pacto federativo. Precisamos definir claramente as atribuições e as competências de cada esfera e o que vai financiá-las, delegando maior autonomia administrativa e financeira a Estados e municípios. E uma federação que se preze não pode permitir que verbas públicas sejam distribuídas ao sabor do interesse eleitoral dos parlamentares e do governo de plantão. O interesse público é que deve pautar as escolhas políticas.

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