Tribunal de Contas destaca um ano de vigência da Lei de Acesso à Informação

Em entrevista, Cezar Miola, presidente do TCE-RS, destaca que a lei é um desdobramento da lógica democrática

Cezar Miola, presidente do TCE-RS

Há um ano, a sociedade brasileira ganhou um importante instrumento de ampliação da transparência e do controle social: a Lei nº 12.527/2011, ou, simplesmente, a Lei de Acesso à Informação (LAI). Já é possível fazer um balanço da experiência em curso com a nova lei?

Após um prazo tão curto, todo e qualquer balanço será, necessariamente, provisório e cauteloso. Para sabermos até que ponto a nova lei irá produzir os pretendidos efeitos de aumento da transparência pública será preciso, é claro, um prazo muito maior. Há determinados efeitos sociais, decorrentes de novas regras, que só se fazem sentir após décadas de vigência. Aqui, ainda com mais razão, vez que se trata – verdadeiramente – de contrastar tendências históricas profundamente arraigadas no Estado brasileiro e nas chamadas culturas institucionais. Feita esta ressalva, entendo que a experiência tem sido globalmente positiva e que já é possível identificar no setor público uma mudança de paradigma. Ela está se processando, o que significa reconhecer que temos estágios a serem cumpridos e metas que ainda não foram atingidas. O que me parece fato, entretanto, é que as modificações em curso vieram para ficar e que a cidadania tem na Lei de Acesso à Informação uma de suas mais poderosas aliadas.

Entre estas metas que não foram atingidas, o que lhe parece o mais difícil?

Primeiramente, há dificuldades que estão situadas na carência de meios para a chamada “transparência ativa”; ou seja, a disponibilização, independentemente de solicitação, de informações qualificadas em sites na internet. Exigências como a de tornar as informações disponíveis às pessoas com deficiência são outro exemplo. Tradicionalmente, o Poder Público desconsiderou as demandas da acessibilidade. Em boa hora, estamos presenciando um esforço para alterar este quadro. Por conta disso, o TCE-RS, para além da fiscalização que lhe cabe, irá oferecer consultoria técnica para as prefeituras e câmaras de vereadores que ainda não se adequaram à Lei de Acesso à Informação. Nossos técnicos estão à disposição dos gestores para auxiliar no que estiver ao nosso alcance, bastando para tanto a solicitação formal. Temos, entretanto, outras carências. Muitos municípios ainda não formaram os Serviços de Informação à Cidadania (SICs), uma das exigências básicas da LAI. Isto sugere que o tema não tem recebido a devida prioridade. Desde uma perspectiva mais ampla, deve-se lembrar, ainda, a necessidade de campanhas institucionais para se difundir o conteúdo da LAI, o que tem sido menosprezado até agora. Na verdade, o mais difícil será construir uma nova relação entre a cidadania e os órgãos públicos, de tal forma que o serviço público perceba que é a participação do cidadão – com a crítica, a sugestão e a cobrança – aquela que irá permitir o aperfeiçoamento da prestação dos serviços e a valorização da própria função pública. O Estado brasileiro não pode ser visto pela população – especialmente pelos mais pobres, que são os que mais precisam do Estado – como uma espécie de “Casa Grande”. Aliás, o Brasil deve se livrar da herança política e cultura de um regime de mais de três séculos que permitiu as Casas Grandes e as Senzalas.

Como a LAI impactou o cotidiano do Tribunal de Contas do Estado?

Antes mesmo da entrada em vigência da Lei, nós já havíamos tomado um conjunto de iniciativas que, sabíamos, iriam alterar o cotidiano da Instituição. Não apenas no que diz respeito às obrigações que passaríamos a ter na observação da lei, mas também como órgão encarregado de fiscalizar a aplicação do novo diploma. Realizamos um seminário no TCE-RS, com a presença de especialistas na matéria e com jornalistas convidados e inúmeras reuniões de trabalho. Nossa determinação foi a de preparar o Tribunal para a vigência da Lei, o que, acreditamos, foi plenamente alcançado. Nosso Portal já oferecia uma quantidade de informações muito grande e as modificações que realizamos têm permitido um acesso cada vez mais facilitado aos interessados. A qualidade do Portal do TCE-RS, aliás, foi destacada por pesquisa da Associação dos Tribunais de Contas (Atricon) que, recentemente, o classificou como o melhor do País entre os seus congêneres. O acesso às informações no TCE-RS tornou-se mais amplo e rápido com a nova Lei. Atualmente, por exemplo, o Tribunal divulga, mediante solicitação, cópia dos relatórios de auditoria, acompanhados das razões do gestor, uma providência que tem oferecido possibilidades inéditas de controle social e uma farta pauta de temas para matérias jornalísticas.

No Brasil, ainda se costuma falar em leis que “pegam” e leis que “não pegam”. Na sua opinião, a LAI irá “pegar”?

Penso que sim. A Lei de Acesso à Informação já pegou. Ela é apenas um desdobramento da lógica democrática e o que acontece é que a democracia também “pegou” no Brasil. Estamos vivendo o mais longo período de democracia em nossa história republicana, o que deveria ser motivo de comemoração. Temos muito a conquistar e desafios enormes no futuro. Aí estão, por exemplo, os desafios de uma educação de mais qualidade, de uma saúde efetivamente universal, de políticas de segurança pública realmente eficazes, o desafio de combater a corrupção e a impunidade, entre tantos outros. Independente disto, o caminho democrático é, cada vez mais, uma opção consolidada no Brasil. O que nos falta, tenho certeza, virá com o amadurecimento político e cultural do País, o que só pode se dar em uma experiência democrática.

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