O último adeus a Pedro Falcão

Sob gritos de “guerreiro”, aplausos e lágrimas, uma multidão se despediu do jovem santanense, 240ª vítima do incêndio na Boate Kiss

“Agora, fisicamente, vai ficar faltando ele… Perdemos nosso guerreiro. A luta foi árdua, mas há uma missão maior para cumprir, agora ao lado do Patrão das Alturas…”. Essas foram algumas das frases ditas na despedida emocionada dos amigos e familiares do jovem santanense Pedro Falcão Pinheiro, 25 anos, que morreu na manhã de sábado, no Hospital Cristo Redentor, em Porto Alegre, onde estava internado desde o dia 27 de janeiro. Pedro foi a 240ª vítima do incêndio que horrorizou o Brasil, na fatídica madrugada em que outros tantos jovens perderam a vida no interior da Boate Kiss, em Santa Maria.

A despedida

Ainda era madrugada quando o corpo de Pedro Falcão Pinheiro chegou na Prefeitura de Sant’Ana do Livramento, local escolhido para o velório. Do lado de fora, amigos e familiares aguardavam com ansiedade, ainda sem acreditar no que acabara de acontecer horas antes, na capital do Estado. Jovens com lágrimas nos olhos, chorando abraçados, insistindo em querer que nada daquilo estivesse acontecendo. “… Parece mentira. É um pesadelo. Alguém, por favor, diga que isto não é verdade…”, exclamou uma jovem, ao ver pela primeira vez o caixão que trouxe o corpo de Pedro.

Durante toda a manhã, cerca de mil pessoas passaram pelo Salão Nobre da Prefeitura, para prestar a última homenagem ao jovem e aos seus familiares. Os pais, chocados e juntos o tempo todo, receberam o carinho e toda a atenção de quem mesmo sem poder sentir a intensidade da dor de perder um filho, fez questão de manifestar a sua solidariedade. Por vezes, o olhar perdido e incrédulo faltamente deixava escapar a vista de uma lembrança relacionada ao filho, de algum momento vivido nos últimos 25 anos.

Eram exatamente 10h45 de ontem, quando o caixão deixou a Prefeitura. Do lado de fora, uma multidão fez ecoar longos aplausos que se misturaram ao choro dos familiares. Por alguns metros, a caminhada silenciosa somente foi interrompida pelos soluços de quem acompanhou de perto e, mesmo não tendo nenhuma ligação familiar, não escondeu a emoção. Um grupo de cavalarianos integrantes do grupo “Os Desgarrados”, do qual Pedro também fazia parte, participando de forma efetiva, principalmente durante a Semana Farroupilha, prestaram a sua última homenagem e acompanharam o cortejo.

 

Coberto com a bandeira do Rio Grande do Sul e com o símbolo do Sport Club Internacional – duas paixões de Pedro – em cima de um caminhão do Corpo de Bombeiros, o caixão com o corpo do jovem seguiu, por volta das 11h, em direção ao Cemitério Parque Vale dos Sinos. Marcio Maciel, amigo que organizou a cavalgada e que também estava coordenando as idas de santanenses até a capital para fazer doações de sangue para Pedro Falcão, disse, logo após o enterro, que todos perderam um grande parceiro nesta fatalidade. “Perdemos um amigo e pudemos ver, nessa hora, que ele realmente tinha outros tantos amigos. Agora, vamos orar por ele, para amenizar a saudade”, disse. Carolina Santos, a jovem que participou da cavalgada que integrou o cortejo e que levava a cabresto o cavalo vazio do jovem Pedro, disse que foi escolhida de forma aleatória. Com lágrimas nos olhos, ela não escondeu a emoção ao falar da honra que sentiu em prestar a última homenagem ao amigo que partiu. 

Multidão

Segundo dados repassados pela Polícia Rodoviária Federal, foram pouco mais de 3Km no cortejo que acompanhou a última viagem de Pedro Falcão até o Cemitério Parque Vale dos Sinos, localizado às margens da BR-158. No local, em torno do túmulo, a despedida emocionada dos familiares e amigos que sentiram ter chegado o momento derradeiro. 

Um Hino para Pedro

“… Sirvam nossas façanhas, de modelo a toda terra…”. Tradicionalista, Pedro Falcão pautou boa parte de sua vida em torno das atividades relacionadas à cultura do Rio Grande do Sul. Assim, um dos maiores nomes do cancioneiro do Estado, o santanense Leonel Gomes, ao pedir aos presentes – cerca de mil pessoas – que cantassem o Hino do Rio Grande do Sul em homenagem a Pedro, teve resposta imediata. Em coro, todos cantaram em tom solene e reverente, tornando o momento ainda mais emocionante. Nesse momento, a comoção coletiva foi evidente, marcando um episódio único na história de Sant’Ana do Livramento. Um forte grito de “Dá-lhe guerreiro”, seguido de fortes aplausos, ecoou por todo o cemitério, na despedida do jovem que ainda salvou vidas antes de precisar ser socorrido e internado, com gravidade, na capital do Estado.

 Pedro Falcão Pinheiro…

Quem, nesses últimos dias, não rezou por ele? Quem não torceu diariamente para que as notícias de seu estado de saúde fossem cada vez melhores? Quem não esperou ansioso pelas postagens da Joanna Barbosa Santana no Facebook, falando sobre os boletins diários? Quem não sentiu vontade de ajudar de alguma forma? Esse último mês foi bem assim para muitos santanenses, e não foi diferente para o Grupo de Amigos “Os Desgarrados”, piquete pelo qual o Pedro desfilava no 20 de Setembro e de cujas atividades frequentava com fidelidade. O Pedro, para todos nós, foi um grande amigo, uma referência de pessoa bem humorada e de bem com a vida. Chegava sempre com um sorriso no rosto e alegrava a todos. Cheio de vida, divertido, bailador dos bons (não deixava nenhuma das gurias sentadas quando uma gaita roncava). Apreciador de uma boa música sertaneja (sempre estava informado sobre os últimos hits que demoravam, no mínimo, dois meses para estourar em Livramento). Uma pessoa de caráter, bom coração e de uma alegria sem fim. Com o Pedro não havia tempo ruim. Sempre pronto para encontrar os amigos na faixa, em festas, rodeios, bailes, gauchadas… e quantas histórias de gauchadas nos deixou para recordar esse nosso gaúcho guerreiro! Podia faltar a carne e até a cerveja, mas não faltava o Pedro nas nossas junções! Representar “Os Desgarrados”, escrevendo sobre o Pedro, não é uma tarefa fácil, pois com certeza vão faltar palavras, histórias que cada um vivenciou com esse irmão de coração, que nesse 2 de março deixou um vazio no nosso galpão, uma saudade infinita, um sentimento de inconformidade e dor pela sua perda… Mas, uma certeza, de que ele jamais será esquecido, pois a imagem que temos dele é de um guri feliz, sempre disposto pra indiada que fosse, parceiro para todas as horas, companheiro, amigo, um verdadeiro irmão, que podia muitas vezes não trocar muitas palavras, mas seu sorriso falava sozinho. Não tinha como não gostar do Pedro. Com seu jeito de ser cativava amigos por onde passava, e isso se prova com o tamanho da mobilização realizada em prol de sua saúde. Quem não conhecia o Pedro começou a simpatizar. Sensibilizou-se com sua situação e todo o Livramento não poupou esforços para ajudar esse guerreiro na sua luta pela vida. Foram caminhadas, correntes de orações, pensamentos e energias positivas, Missas, Cultos, doações de sangue… Não tem como não citar aqui o empenho da Beatriz e do André Ozório e de tantas outras pessoas que moveram “montanhas” para que todos nós entrássemos com o próprio sangue nessa luta por um amigo. Foi simplesmente lindo! Foi emocionante a união e amizade entre todos! O Pedro fez máscaras caírem, distâncias diminuírem, corações abrirem, diferenças acabarem. O Pedro nos deu uma baita lição de vida com a sua própria vida. Ele é o nosso maior exemplo de guerreiro, de garra, força, amizade, bondade e heroísmo. Sim, heroísmo. O Pedro salvou vidas, não mediu esforços para ver seus amigos bem, sãos e salvos. Ele não se entregou, não fugiu da luta em momento algum. Mostrou-nos o quanto podemos ser fortes e que a única coisa que importa na vida é simplesmente viver. Agora, nosso irmão amado está em seu merecido descanso e olhando por cada um de nós, do Céu. Nosso herói virou anjo. O nosso Anjo da Guarda Desgarrado! Pedro, tu jamais será esquecido! Tua alegria é a nossa força! Teu sorriso é o que deixaste em nossa memória! Tua garra é o nosso exemplo!

Bruna Postiglione Wetternick, em nome de toda a família “Desgarrados”.

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