Fernanda resolve falar

A repercussão da entrevista realizada com Rodrigo Nunes Moreira, dentro da Penitenciária Estadual de Livramento, na semana passada, foi tanta, que a família da comerciária Fernanda Camila Alves Nunes resolveu se manifestar, após um longo silêncio desde 23 de novembro, dia em que Rodrigo atirou cinco vezes contra a ex-esposa, dentro do Pronto-Atendimento Médico do hospital Santa Casa.

A família da vítima agora está sendo representada pelo advogado Claudio Munhoz, que também falou sobre o caso e sobre as principais medidas que estão sendo tomadas para garantir a segurança de sua cliente. 

ENTREVISTA

“Ele colocou a perna em cima do meu corpo para que eu não fugisse e atirou”

A Plateia: Qual seu atual quadro de saúde e em quanto tempo você ficará totalmente restabelecida?
Fernanda: Estou muito fragilizada, não sei quanto tempo vou precisar para me restabelecer.

A Plateia: Como era sua relação com Rodrigo antes da separação? Ele era violento?
Fernanda: Ultimamente, nossa relação estava muito ruim, mas ele sempre foi violento e agressivo. Ele me dizia tudo que vinha na sua boca, sofri humilhações de toda ordem.

A Plateia: Quando você decidiu pôr um fim no relacionamento e por quê?
Fernanda: Decidi em função das brigas e ameaças. Eu não era feliz. Ele não me deixava fazer nada, sequer conviver com a minha família. Eu só podia sair de casa com ele. Nem com a minha mãe podia conviver. O que mais me apavorava é que ele dizia sempre que “iria me matar e não dava nada”, pois iria se apresentar com advogado em 48 horas. Com o passar do tempo, vi que a situação era séria, precisava sair daquela casa, de perto dele, buscar proteção com minha família.

A Plateia: No dia do atentado, como tudo começou?
Fernanda: Saí da casa de minha irmã e meu cunhado me levou para o centro, onde fui pagar algumas contas. Logo após, fui até a escola General Neto, onde minha mãe trabalha. Nossa ideia era ir à Igreja da Graça para um culto religioso.

A Plateia: Rodrigo disse que não lembra o que ele fez. O que realmente aconteceu antes de você chegar ao Pronto-Atendimento do hospital?
Fernanda: Ele chegou à escola e perguntou por nós, quando uma colega da minha mãe disse que havíamos saído. Ficamos esperando que ele fosse embora. Saímos dali, passamos pela Câmara de Vereadores, quando, na frente do Hospital, vi que o Rodrigo vinha de automóvel. Ele estacionou e pediu para conversarmos. Foi quando disse que já tinha tomado minha decisão, e não voltaria. Ele, então, insistiu para que aceitasse a carona. Como eu não quis, tirou a arma apontando em minha direção. Apavorada, saí correndo. Minha mãe, desesperada, tentava segurá-lo, mas não conseguiu… É difícil falar sobre isto, as imagens mostram o que aconteceu.

Fernanda Camila Alves Nunes

A Plateia: Do que você lembra quando ficou acuada dentro do Pronto-Atendimento?
Fernanda: O que eu vivi não desejo para ninguém. Achava que ia morrer, não tinha para onde fugir, fiquei deitada no chão, acuada, com muito medo. Tentei abrir a porta interna do Pronto Socorro que estava fechada. Como não tinha para onde ir, me joguei no chão e continuei batendo na porta e pedindo socorro. Neste momento, ele colocou a perna em cima do meu corpo para que eu não fugisse e atirou. Senti dois disparos que atingiram minha cabeça, veio uma dor muito forte e muito sangue. Fiquei apavorada.

A Plateia: Você ainda sente medo dele?
Fernanda: Sim, sinto muito medo. Ele tentou tirar a minha vida, não tem como superar, nem esquecer o que aconteceu.

A Plateia: Ele fala muito em traição, mas em algum momento isso de fato teria ocorrido?
Fernanda: Não, isto nunca ocorreu. Ele era muito ciumento, não me deixava sair sozinha, usar determinadas roupas, tinha senha das minhas páginas nas redes sociais, e estava sempre me controlando. O celular era dele, eu não podia ter um. Quero dizer que fiquei muito triste com as declarações do Rodrigo, foi como se tivesse tentando me matar de outra forma, através da mentira. Sinto vergonha de encarar as pessoas mais próximas. Quem me conhece sabe que eu jamais trairia meu marido. Sou evangélica.

A Plateia: Você acha que vai conseguir perdoá-lo depois de tudo isso?
Fernanda: Não sei.

A Plateia: O que você gostaria de dizer para a família de Rodrigo?
Fernanda: Fiquei muito triste com o que aconteceu, pois gostava muito deles.

A Plateia: Que conselhos você daria para as mulheres vítimas de maus tratos?
Fernanda: Que nunca deixem chegar ao ponto em que eu cheguei. Eu deveria ter reagido antes, mas fiquei com medo. Busquem o socorro das autoridades competentes, comuniquem o fato e não se deixem dominar pelo medo. Pelo apoio que tenho recebido, vejo que se tivesse buscado em tempo a proteção que todas as mulheres vítimas de violência têm direito, isto não teria ocorrido.

“Fernanda é uma pessoa simples, honesta, sincera, que jamais traiu seu marido”

Claudio Munhoz, advogado de Fernanda

Entrevista com Claudio Munhoz, advogado de Fernanda.

A Plateia: Qual seu parecer a respeito da afirmação do réu de que teria agido motivado por suposta traição?
Cláudio Munhoz: No meu ponto de vista, o réu demonstra, novamente, ser possuidor de um desejo irrefreável de atentar contra a vida de sua esposa. O arrependimento é mera aparência, sem conteúdo formal. Uma vez que não conseguiu seu objetivo, busca atingi-la moralmente, criando um cenário distante da realidade dos fatos. Quem se arma com revólver e atira de surpresa na vítima, atingindo-a duas vezes na cabeça, não pode alegar excludente de ilicitude de legítima defesa da honra.
Fernanda é uma pessoa simples, honesta, sincera, que jamais traiu seu marido.

A Plateia: De que forma a acusação pretende sensibilizar o Juiz para que o mesmo mantenha o réu preso até o julgamento?
Claudio Munhoz: Os fatos falam por si: se ele foi capaz de disparar cinco vezes contra sua esposa e não conseguiu atingir seu objetivo, quem garante que, uma vez colocado em liberdade, não venha a tentar novamente? Na remota hipótese de vir a ser solto, quem vai garantir a integridade física de Fernanda e de sua família, a qual vem sofrendo constantes ameaças? Vamos tomar as medidas cabíveis, em direito admitidas, para que isto não venha a ocorrer.

A Plateia: Este é um caso para ser levado a Júri Popular ou há a possibilidade do réu ser condenado antes disso?
Claudio Munhoz: Não tenho dúvidas de que caberá ao Tribunal do Júri a decisão final e espero que efetivamente isto venha a ocorrer, com a maior brevidade possível. A sociedade deve dizer se concorda ou não com este tipo de conduta, se o réu merece o perdão ou a responsabilização por sua livre e deliberada vontade de matar sua esposa, a qual queria apenas e tão somente recomeçar sua vida em função da violência e agressividade a que esteve exposta durante a relação conjugal.

A Plateia: Na hipótese que o réu seja posto em liberdade, que tipo de medida pode ser tomada, no sentido de garantir a segurança da vítima?
Claudio Munhoz: Não existe medida protetiva capaz de garantir a integridade física de Fernanda. Na prática, isto não existe. Quem é capaz de disparar cinco tiros contra sua esposa, considera como se fosse seu patrimônio, não a respeita como ser humano. Não acredito no seu arrependimento. Se vier a ser colocado em liberdade, farei com que Fernanda saia da cidade. É a única alternativa.

A Plateia: Que tipo de provas, além das imagens captadas pelas câmeras de segurança do hospital, a acusação dispõe contra o acusado?
Claudio Munhoz: Mais do que as existentes? Elas não são suficientes? Em verdade, de acordo com as concepções morais da Sociedade Santanense, a tentativa de homicídio praticada pelo réu é rechaçada frontalmente, demonstrando, na sua forma de agir, profundo desprezo pelo valor da vida humana. Os fatos falam por si.
A Plateia: Como fica a vida de sua cliente, daqui para frente?
Claudio Munhoz: Fernanda é uma sobrevivente, vítima de violência praticada de forma vil e covarde. Ela não teve como se defender. Jogada no chão do Pronto-Socorro, ficou em posição fetal porque não tinha o que fazer, dominada pelo medo, sentindo duas balas atingirem seu cérebro. Não é fácil enfrentar uma situação como esta, mas a vida segue em frente. Tenho procurado, juntamente com seus familiares, demonstrar que ela é um símbolo para todas as mulheres indefesas, subjugadas e humilhadas por homens de má índole, que buscam apenas a satisfação de seus próprios interesses. Embora se recupere fisicamente, dificilmente voltará a ter uma vida normal. As sequelas são irreversíveis.

 Reportagem: Jorge Flores

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