ESPECIAL CRIME PASSIONAL

“O passional é um doente ocasional equiparando-se aos inimputáveis”

Fernanda Camila Alves Nunes

Recebeu alta hospitalar a comerciária Fernanda Camila Alves Nunes, de 22 anos, que foi baleada pelo ex-marido, na tarde de 23 de novembro, dentro do Pronto-Atendimento do Hospital Santa Casa, em Livramento.

Fernanda levou dois tiros, sendo um deles na cabeça, e se recupera bem, sem sequelas.

O acusado Rodrigo Nunes Moreira, comerciante de 31 anos, está preso na Penitenciária Estadual de Livramento e responde por crime de tentativa de homicídio duplamente qualificado, segundo a Polícia Civil.

Apesar das inúmeras tentativas, a reportagem não conseguiu ouvir ninguém da família de Fernanda, que não quer se manifestar no momento sobre o caso.

Já com relação ao acusado, a situação foi diferente. Esta semana, foi realizada uma entrevista com os advogados de defesa de Rodrigo, Fernando Góes e Filipe Góes, e também outra com o indiciado, dentro da Penitenciária de Livramento.

Entrevista com os advogados Fernando Góes e Filipe Góes, que vão tentar no Tribunal do Júri convencer os jurados sobre a inocência de Rodrigo. 

Os advogados Filipe Góes e Fernando Góes

A Plateia: Em que fase está este caso?
Fernando e Filipe: O flagrante está sendo remetido para o Judiciário e este encaminhará a matéria para o ministério Público, possivelmente para oferecer a denúncia. Já foi decretada a prisão preventiva do acusado, que se encontra preso na Penitenciária Estadual de Livramento.

O entendimento da defesa é que Rodrigo, uma vez denunciado, na condição de réu, será levado ao Tribunal do Júri, possivelmente respondendo por tentativa de homicídio, já que não houve morte. 

A Plateia: A defesa vai tentar a soltura do indiciado em que momento?
Fernando e Filipe: Vamos tentar a liberdade provisória dele, em seguida que houver um momento adequado, até porque se trata de uma pessoa sem antecedentes criminais, de um bom convívio social, de um excelente comportamento, um homem jovem, trabalhador, que se envolveu em uma situação totalmente imprevisível. Nós entendemos que ele não apenas será colocado em liberdade, como também, na presença dos jurados, deverá ser absolvido, já que não tinha no momento as menores condições para avaliar essa situação em que se envolveu – estava totalmente tomado pela paixão. 

A Plateia: Como explicar este tipo de atitude para tentar a absolvição do acusado?
Fernando e Filipe: A literatura criminal registra inúmeros casos de fatos semelhantes de acusados passionais, e muitos foram absolvidos com esta tese. Nós, inclusive, já trabalhamos em processos desta natureza. Acontece que no momento em que a pessoa é tomada por tal paixão, ela não consegue mais discernir os fatos em que está envolvida, e se equipara ao que prescreve o artigo 26 do Código Penal, a imputabilidade penal: “É isento de pena o agente que, por doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, era, ao tempo da ação ou da omissão, inteiramente incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de acordo com esse entendimento”.

Ainda que a lei não estabeleça um critério para análise de problemas desta natureza, de fatos deste tipo, nós entendemos que a lei não é abrangente ao ponto de responder a todo o tipo de comportamento humano. A legislação não trata especificamente deste caso, então o Direito tem que se socorrer na Psicologia, da Psiquiatria, da Filosofia, em ciências que possam melhor explicar essa situação. Não basta querer julgar uma pessoa pelo exame frio da Lei, porque existem outras condições presentes para orientar como se proceder nestas circunstancias. Inclusive na literatura universal. Freud, por exemplo, foi o que mais estudou a mente humana e não conseguiu entender determinados tipos de comportamentos humanos. Como é que o código penal, que foi elaborado em 1940, pode abranger todos os tipos de comportamento humano. No momento em que pratica o fato, dito delituoso, o passional é um doente ocasional, equiparando-se aos inimputáveis do artigo 26. Ele estava totalmente incapacitado de entender o caráter ilícito do fato, de modo que deve ser isento de pena. Nosso entendimento é esse e estamos construindo uma tese, cuja essência diz que há uma reversão dialética do amor em ódio.

Sabe-se perfeitamente, como observação da literatura ou até mesmo pelos noticiários dos jornais, que muitas vezes o amor se transforma em ódio e a recíproca é verdadeira, o ódio pode se transformar em amor. Tem casos de moças sequestradas que, apesar de colocadas em cativeiro, acabam se apaixonando pelo sequestrador. O Rodrigo construiu toda a vida dele com esta relação, era um relacionamento que já tinha seis anos. Eles tinham casado há dois anos e ele jogou toda a vida dele naquilo ali. Lá pelas tantas, é surpreendido pelo interesse da moça em romper o relacionamento. Inclusive ela transgrediu as relações que tinha com ele, optando por relações paralelas, ou relação paralela, o que, por quatro meses, fez a cabeça deste rapaz sofrer um revertério, uma transformação totalmente violenta, tendo o desfecho que todo mundo sabe.

Nós não vamos discutir o que realmente aconteceu, porque o fato em si não tem controvérsia. Admitimos tudo aquilo que foi apresentado na televisão, aquilo que foi filmado, ali não tem o que se discutir. O fato é esse, só dizemos é que este rapaz (Rodrigo) não pode receber pena, porque estava em um estado doentio. De modo que a sociedade e a legislação não têm condições de contemplar casos deste tipo. O Tribunal do Júri existe justamente para isso, para que o jurado tenha uma amplitude maior do que a do juiz e possa melhor entender os comportamentos humanos e julgar o indivíduo em melhores condições de percepção, encaminhando uma melhor uma solução para o fato. Realmente, é uma situação profundamente lamentável. Nós, como defensores, entendemos que esta moça e a família dela estão passando por um sofrimento muito grande, mas não é levando à cadeia uma pessoa que estava, no momento, totalmente descontrolada, enferma e doentia, sem capacidade de analisar a situação, sem antecedentes criminais, que alguém sairá ganhando. Condená-lo, e o mandar para uma instituição penitenciária que não tem condições de recuperar as pessoas, é um absurdo.

Não há mais como reparar o fato já acontecido, que ninguém queria, mas que acabou ocorrendo.

Entrevista com o acusado Rodrigo Nunes Moreira, de 31 anos de idade, dentro da Penitenciária Estadual de Livramento, no início da tarde de sexta-feira.

“Naquele momento, tudo embaçou na minha cabeça, já não vi mais nada… não sabia o que estava fazendo”

A Plateia: Qual foi o motivo que levou vocês à separação?
Rodrigo: O motivo da separação foi a traição por parte dela. Descobri tudo pelo telefone. O cara me ameaçando, mandando mensagem, e fui descobrindo. Comecei a pensar bobagem. 

A Plateia: Quando ocorreu esta descoberta, a Fernanda ainda morava contigo?
Rodrigo: Não morava mais, pois foi no dia que ela saiu de casa, que aconteceu tudo isso. Procurei o pai dela para ver se ele me dava uma solução para o que estava ocorrendo, em relação às ameaças, e ele me orientou que registrasse uma ocorrência. 

A Plateia: Por que esta pessoa te ameaçava?
Rodrigo: Ele me ameaçava porque estava com ela. Neste dia em questão, pela manhã, estive em casa e até trouxe um pãozinho para ela, antes de sair para o trabalho. Então, tocou o celular e ela disse que era de uma agência bancária e pedi para ela me passar o telefone que eu iria passar um fax para pagar o carro. Peguei o celular porque ele era meu, mas não tinha costume de usar muito. Liguei novamente para aquele número e o cara que atendeu do outro lado já começou a me ofender. Perguntei para ele porque estava ligando para minha mulher e com quem ele queria falar. Ele me respondeu: “tu já perdeu a mulher, o que tu quer, que não larga ela?”. 

A Plateia: O que aconteceu depois?
Rodrigo: Perguntei para ela o que era aquilo, que tinha um bagaceiro ligando para ela. Neste momento, a Fernanda saiu de casa, indo morar na casa do pai. Então, no restante do dia, esse cara me atormentou todo o tempo, mandando mensagem, ligando e eu ficava mais furioso e acabava ligando para ele também, queria saber quem era. Disse que ele estava estragando todo o meu casamento, botando tudo por água abaixo e ele seguia dizendo: “tu vai ver na hora. Vai ter um momento que tu vai ver e eu vou te atirar”, então me desesperei. 

A Plateia: Em que momento você adquiriu o revólver utilizado durante a tentativa de homicídio?
Rodrigo: No outro dia, fiz uma corrida (motoboy) e foi por causalidade, um cliente me perguntou se não queria comprar um revólver. Perguntei quanto ele queria e ele disse R$ 800,00, porque era bem novinho. Acabei comprando, em função das ameaças. Foi no período em que ela estava fora da cidade. 

A Plateia: Em algum momento você pensou em procurar a Polícia para denunciar as referidas ameaças?
Rodrigo:Eu falei com meu sogro, que é da Polícia, e ele me disse que teria que fazer um registro. Contei então para ele que já tinha até pensado em suicídio. Tinha feito até uma carta, porque era humilhação demais, procurei dar tudo de bom para ela, então tinha decidido me dar um tiro. Fiz um bilhete, o qual meus advogados têm. O meu sogro então me convidou para ir a uma igreja, enquanto a Fernanda viajava, e prometeu que depois que ela voltasse iria tentar conversar.

A Plateia: Você chegou a presenciar sua mulher com outro?
Rodrigo: Sim. Comecei então ir à igreja e depois quando ela chegou, eu acabei vendo aquilo que não queria. Ela estava dento da caminhoneta do outro. E naquele momento, tudo embaçou na minha cabeça, já não vi mais nada, comecei a me sentir mal e realmente não sabia mais o que estava fazendo.

A Plateia: E em que momento você encontrou com a Fernanda e sua mãe?
Rodrigo: Depois daquela cena, dei uma volta e me encontrei com ela e vi aquela imagem e não lembro mais nada. Fui ver tudo pela televisão, já preso. É um absurdo o que eu fiz.

O acusado e seus advogados

A Plateia: Você sempre andava com a arma no carro?
Rodrigo: Comecei a andar, a partir das ameaças por telefone. Depois melhor pensando me perguntei como vou em um local em que está todo mundo para ser atendido e vou chegar atirando. Foi uma coisa que me tirou de si, não consigo compreender o que houve comigo.

A Plateia: Precisamente onde você encontrou com elas:
Rodrigo: Vi quando ela desceu da caminhoneta atrás da Escola General Neto e entrou no colégio. Fiquei sem ação.

A Plateia: Como ela se encontrou com a mãe?
Rodrigo: Não sei te explicar. Só lembro que quase entrei de carro na contramão, ouvi uma buzinada de outro veículo e quando fiz a volta na rua, encontrei com elas. Depois disso, não me lembro de mais nada.

A Plateia: Alguma vez ocorreu algum tipo agressão física enquanto vocês estiveram casados?
Rodrigo: Com agressões não. Discutimos, como qualquer casal normal, mas sempre nos reconciliamos.

A Plateia: Você pensou em algum momento em matá-la?
Rodrigo: Nunca pensei em fazer mal para ela. Agora, do outro, eu pensava em me defender, porque uma pessoa fala que vai te matar, te ameaça. Vai saber.

A Plateia: Você se arrepende do que fez?
Rodrigo: Me arrependo. E quero – graças a Deus acho que está tudo bem com ela – que ela me perdoe, vou seguir minha vida e ela a dela, porque no fundo várias pessoas foram prejudicadas com tudo isso, minha família, a dela. Não sou ninguém para tirar a vida de outra pessoa. (Rodrigo chora neste momento).

A Plateia: O que você pretende fazer se conseguir responder ao crime em liberdade?
Rodrigo: Preciso tirar uns dias longe de todos, para colocar a cabeça no lugar. Preciso trabalhar, porque tenho dois filhos, que moram com minha mãe. Tenho as famílias que dependem daquele meu setor, além dos meus empregados, que dependem de mim, inclusive um está com sua esposa na UTI da Santa Casa, então não posso fechar assim. Pretendo tocar meu negócio e depois que resolver tudo, talvez ir embora.

A Plateia: Que mensagem tu gostaria de mandar para a família da Fernanda?
Rodrigo: Que me perdoem (chora novamente), eu não sabia o que estava fazendo. Já andava cansado e não andava me alimentando.

A Plateia: Tu acreditas que um dia ela possa te perdoar?
Rodrigo: Está na consciência dela.

Reportagem: Jorge Flores | Fotos: Marcelo Pinto

Vídeo na integra da entrevista 

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1 Comentário

  1. alejandrodsv

    E un caso triste a pena dele deve ser curta y acompanhada por especialistas neste caso iso e o amor ? ? ?

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