“No Brasil, a proposta de inclusão é diferente do projeto estudado no Uruguai”

Reportagem: Qual foi o mote da sua pesquisa e o que a incentivou a realizá-la?
Pesquisadora: A pesquisa surge no âmbito da inclusão digital do Uruguai, por vários motivos. O primeiro é por eu ser natural da Fronteira e perceber as riquezas e peculiaridades desta região, que necessita de um olhar especial. E ainda escolhemos analisar este projeto de inclusão digital com vistas à inclusão social, porque o projeto de distribuição de computadores no Uruguai encontra-se moldado de uma forma que o computador é de propriedade do aluno, ampliando, com isso, a exploração destes para outros contextos, chegando à família, permitindo possíveis modificações na sociedade na qual está inserido. 

Reportagem: Como essa análise foi feita? Duarante quanto tempo foram observados os alunos nas escolas uruguaias e quais foram as idades e séries pesquisadas?
Pesquisadora: A análise foi realizada com dados coletados na cidade de Rivera. Durante dez meses, realizamos observações da utilização dos computadores pelos alunos fora do ambiente escolar, compondo assim um estudo etnográfico. Os alunos que compõem este estudo estão na faixa etária entre 6 e 14 anos de idade, frequentam escolas públicas e foram beneficiados com o projeto. 

Reportagem: Por que pesquisar o comportamento dos estudantes e o uso da tecnologia fora da escola?
Pesquisadora: No âmbito escolar, muitas pesquisas já estão sendo realizadas ao longo dos tempos. Por isso, procuramos inovar e estudar o comportamento destes alunos fora da escola, com o objetivo principal de identificar novos posicionamentos e o reflexo destes através do uso da ferramenta tecnológica, e ainda perceber como esses novos sentidos podem ser observados na sociabilidade em família e na sociedade como um todo, destes alunos. 

Reportagem: Sob seu ponto de vista, a inclusão digital já é uma realidade nas escolas Uruguaias? Quais os dados que evidenciam êxito do programa?
Pesquisadora: Nosso foco na pesquisa não foram as escolas uruguaias, mas sim o uso dos computadores fora destas. Por isso, não levantamos os dados da inclusão na escola, mesmo identificando ao fim do levantamento que as escolas e seus professores moldam a utilização dos computadores pelos alunos fora da escola. Os dados que apontam êxito no programa são a possibilidade de manutenção dos computadores nas proximidades das escolas destes alunos, a mobilidade do uso do computador, já que este é de propriedade dos alunos, além das possibilidades de conexão à internet nas escolas e nas praças públicas do Uruguai, ampliando a utilização destes recursos em outros meios. 

Reportagem: Esse projeto também está sendo aplicado nas escolas brasileiras. Em que aspectos essa realidade já ocorre no Brasil e o que o nosso País precisa aprender com a experiência uruguaia?
Pesquisadora: No Brasil, a proposta de inclusão é diferente do projeto estudado no Uruguai. O projeto aqui atende apenas algumas localidades, e na maioria dos casos os alunos não têm a condição de levar o computador do projeto para suas residências. Embora os projetos dos dois países venham sendo implementados de forma diferente, ambos possuem o mesmo propósito inicial: oferecer aos alunos novas ferramentas tecnológicas, com objetivo de alcançar uma inclusão digital de fato. Acredito que vários aspectos do projeto do Uruguai possam servir de exemplo para o projeto do Brasil, mas como destaque, aponto a forma de manutenção dos computadores adotada no país vizinho, trazendo mais agilidade com a proximidade nesta execução, impedindo que os alunos se afastem do uso do computador. Outro aspecto de destaque no projeto do Uruguai são as formas de conexão à internet, oferecendo pontos de acesso nas escolas do bairro e ainda em praças públicas, criando, assim, locais de encontro e uso dos computadores pelos alunos beneficiados pelo projeto. 

Reportagem: Quais são os desafios do uso da tecnologia para o professor e aluno? Qual a importância do professor nesse processo de inclusão digital e o seu papel junto ao aluno?
Pesquisadora: Os desafios de ambos são grandes frente a esta proposta de inclusão digital de fato. Acredito que ainda o professor seja o grande motivador deste processo. No caso estudado, os alunos e seus familiares retratam em suas falas que o professor e a escola são moldadores do uso dos computadores, mesmo este ocorrendo fora do educandário. O professor precisa ainda entender que hoje ele pode aproveitar a aprendizagem do aluno para, juntos, aprenderem. Acredito nesta troca entre ambos.

 

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