Sociedade e esquerda insuportáveis

Um debate provocador em São Paulo: Guy Standing diz que a sociedade e a esquerda vão se tornar insuportáveis, se não adotarem e radicalizarem programas sociais, educação e saúde. Pela primeira vez na história, a esquerda institucional não tem, em todo o Brasil, uma agenda de transformações. Ela esqueceu três princípios. Primeiro, que todo movimento político progressista é construído em cima da raiva, necessidade e aspirações de uma classe emergente. Hoje, essa classe é usuária dos serviços precários, presente em quase tudo no nosso país, quase nada funciona direito porque a espiritualidade da “esquerda” é rasa por alocar todo o mal fora da pessoa.

A parte dura da precariedade é a que está sendo vista nos hospitais, aeroportos, transporte coletivo, arrastões de bandidos, violência nas escolas, e para completar uma justiça míope. Em São Paulo e nos ataques de quadrilhas em todo o país estamos sendo atacados por uma classe de desregrados que não são de uma classe inferior, mas se não a entendermos, esses ataques tipo arrastões serão os primeiros de muitos – assim irão crescer os ataques violentos que espalhará como fogo neste país se a sociedade não se mobilizar com uma contrarrevolta contundente.

Um segundo princípio esquecido é que todos os avanços em direção a uma sociedade mais igualitária envolvem novas formas de ação coletiva. Os sindicatos precisam adaptar-se e alcançar novos grupos, ao invés de serem simplesmente instrumentos desgastados para frear a mudança.

O terceiro, que toda marcha revoltosa para frente envolve lutas sobrepostas, no caso atual, é por reconhecimento: a luta para ter uma identidade, como a precariedade dos serviços públicos – e não se envergonhar de afirmar tal condição, ou de reivindicar que suas inseguranças e seus interesses sejam levados em conta. Na luta por representação, ainda temos muito que avançar, mas a demanda das precariedades por envolvimento em órgãos que tomam decisões e em plataformas de políticas sociais não está evoluindo.

Vivemos em meio a uma transformação global, enfrentando desigualdades absurdas e insegurança crônica. Nessa situação, novas políticas progressistas precisam ser construídas em torno de uma luta para que a classe emergente tenha igualdade no controle efetivo dos recursos-chave da economia. Na sociedade de serviços de hoje, esses recursos não são os “meios de produção” do antigo projeto socialista.

Nossos políticos precisam entender que a sociedade está com medo, precariedade que está crescendo e que requer uma resposta mais completa. Ela é dada em um novo livro, The precariat – The new dangerous class (A nova classe perigosa). Mas essencialmente esta classe surgiu da liberalização promovida pela globalização. Os políticos devem ter cuidado. É uma nova classe perigosa, mas não o que os marxistas descreveríamos como classe para si, e sim uma classe em construção, dividida entre grupos revoltados e frustrados, porém unidos pela insegurança e medo.

 

Carlos Alberto Potoko

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