Transparência: evolução e involução

A Lei de Acesso à Informação, mais do que uma mudança imediata nos parâmetros de publicização dos dados públicos, representará um significativo choque cultural para a realidade administrativa brasileira. Trata-se de um necessário e produtivo movimento, que iguala o Brasil, mesmo que tardiamente, a mais de 90 países que já haviam adotado iniciativas semelhantes. Nos Estados Unidos, por exemplo, a Lei da Liberdade da Informação foi sancionada em 1966. Depois, diplomas parecidos foram adotados por Suécia e Finlândia. Não por acaso são três nações que possuem elevados índices de desenvolvimento, mesmo tendo passado por crises econômicas – como no caso dos norte-americanos.

Os paradigmas internacionais, porém, mostram que não basta apenas o impacto promovido pela lei na opinião pública. É preciso dar aplicabilidade à letra da norma. E aí o resultado aparece: na Índia, ajudou a população a reformar casebres em áreas desassistidas; no México, corrigiu falhas de um programa que subsidiava pequenos agricultores; na Tailândia, melhorou o sistema de matrículas da rede de ensino. E há um sem-número de outros relatos a comprovar avanços nas áreas que afetam diretamente a vida das pessoas, tais como saúde, educação, segurança e serviços públicos em geral.

Lançar luzes sobre o que ainda se esconde é um dos melhores antídotos para combater a corrupção. Não será a solução perfeita, porque isso depende da adesão moral dos indivíduos, mas, inequivocamente, será um fator de inibição de desvios. A gravidade da situação nacional nesse quesito é evidente. Na pesquisa que mede o Índice de Percepção de Corrupção, promovido pela ONG Transparência Nacional, em 2011, o Brasil ficou em 73º lugar entre 182 países, bem atrás de vizinhos como o Chile (22º) e o Uruguai (25º). Para além dos levantamentos, o sentimento dessa verdadeira chaga é aferível facilmente no cotidiano social.

Na última semana, a propósito, o Congresso Nacional colaborou para, novamente, reforçar o juízo depreciativo que a população possui da classe política. A CPMI criada para investigar o caso Cachoeira foi tomada por um turbilhão de pressões destinadas a abafar pautas e proteger determinadas figuras de renome nacional. Da situação à oposição, muitos começaram a fazer esforços não mais para apurar, senão que para seu contrário: esconder, blindar e desviar o foco investigativo deste ou daquele quadro político. Tem tudo para ser mais um lastimável episódio dos já bem recheados capítulos de impunidade que envergonham o país.

Portanto, em poucos dias, assistimos a um Brasil que quer andar para frente e a outro que insiste em andar para trás, ainda cultivando práticas das quais a sociedade quer se livrar. Um gol contra, outro a favor. E essa dicotomia permite constatar que não podemos ser tomados pela desesperança, tampouco pelo falso otimismo. Estamos num estágio que nos avizinha da condição de verdadeira potência mundial, mas eventualmente ainda cultivamos hábitos defasados. É preciso manter a vigilância, pois. Para cada involução, a sociedade e os bons líderes de que dispomos precisarão fazer um esforço dobrado de compensação. E a Lei do Acesso à Informação é um bom ensejo para que os gestores públicos deem esse bom exemplo.

 

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