Admiráveis portugueses sonhadores

Homens maravilhosos de imaginação criativa, da transubstanciação da história entre os continentes, em suas caravelas com velas plácidas a deslizarem nos seios dos mares da civilização sem portos. Empurrados pelos ventos da invenção dos mecanismos de imprimir, tornando possível a difusão da inteligência combinada com os espíritos livres, como Cristóvão Colombo. Dá-se início a uma nova era de combinação perfeita de homens, suas naves e seus sonhos. É o início de tempos diferentes, onde um espírito de redescobrimento encontra-se a vontade de encerrar a idade média, como se fora um livro lido até a última página.

Tudo começou com D. Henrique, filho de D.João I, entusiasta das viagens descobridoras, concentrou na armação de navios todos os seus recursos, mudando-se para o promontório de Sagres, onde reuniu homens práticos da navegação em forma de escola, onde atraíram marinheiros italianos, cartógrafos judeus e fizeram construir caravelas mais esbeltas e viageiras. Eram navios indicados para dificuldade de retorno e falta de ventos compensado no sonho de ciência e glória com o descobrimento das ilhas Guiné da costa da África. Dobrando essa ponta misteriosa, que na geografia ideal da divina comédia era o fim do mundo, pois a idéia fixa era a Índia com seus indescritíveis tesouros, onde essa corrente de acontecimentos estava predestinado o nascimento de um novo mundo.

Falecendo D. Henrique, D.João II com um zelo profético, levou com mãos firmes as navegações de alto mar, onde em 1495 foi venturoso com um feliz reinado porque Vasco da Gama com três caravelas conseguira afinal dobrar o cabo das tormentas e alcançar o Índico. Voltou carregado de tantas riquezas, que se justificava o envio sem perda de tempo de outra frota, não mais para descobrir o caminho da Índia, mas para conquista-la. Foi incumbido de chefiar essa poderosa armada, um leal português Pedr’Álvares Cabral, que com treze caravelas e seus capitães: Sancho de Tovar, Simão de Miranda, Aires Gomes da Silva, Nicolau Coelho, Bartolomeu Dias, Diogo Dias, Simão de Pina, Pero de Ataíde, Vasco de Ataíde, Nuno Leitão da Cunha, Luís Pires e Gaspar de Lemos, lançaram-se ao mar com direito a uma missa na véspera, no dia 9 de março de 1500.

Em formação para evitar a dispersão, a 14 de março passaram entre as canárias e a 23 desgarrou a nau de Vasco de Ataíde, o maior responsável pelo descobrimento do Brasil, isso porque se não houvesse um distraidinho, quantos anos quem sabe, nós teríamos que esperar para comemorar por todos estes séculos o descobrimento do nosso país. Isso para não divagar no tempo e chegar a conclusão de que não poderíamos sequer termos nascido. Já pensaram? E assim, certo mesmo é que estamos aqui e agora fazendo parte desta transubstanciação da história da nossa alegre pátria como inocentes invasores. Mesmo tendo-se perdido uma nau em sua busca, perdeu-se a rota ao sabor da brisa do mar, desta desorientação declinaram para oeste, até que, numa manhã de quarta feira do dia 22 de abril, com uma alegria maior do que a surpresa, aparece um monte muito alto e arredondado ao sul dele, em terras baixas, um mundo de arvoredo. Era a terra de Vera Cruz, dos navios desceram para ouvir Cabral sobre o acontecimento e depois exploraram a praia pela margem de um rio mata adentro, até quando de repente, deparam-se com uns homens pardos nus, sem nada que lhes cobrisse suas vergonhas. Traziam arcos nas mãos e seus dardos, todos rijos em batéis, desceram sem medo, mas com movimentos delicados. Nicolau Coelho, instintivamente e com uma elegância peculiar da época, lhes fez sinal que pusessem os arcos no chão; eles puseram. A partir dali, não pode deles haver fala nem entendimento até a data de hoje. Invadimos o território deles com a colonização, doutrinamo-los com a ideologia da civilização e estamos agora a comemorar por todos estes séculos a exterminação desses brasileiros que muitos de nós descendemos.

Neste início de milênio, vivemos a navegação da civilização planetária via Internet, evolução das viagens transcontinentais e do tempo, é uma viagem sem portos e sem volta. Somos todos navegadores sem direito a vida individual, mas comprometidos com a biodiversidade continental. Temos que cuidar de nossas florestas e todas as suas formas de vida como os índios, especialmente, sem deixar que nosso consumismo se oponha a seus costumes, sem deixar que destruam a sua cultura, porque dela depende o nosso referencial e sem deixar que matem o seu espírito, porque dele sopram os ventos que estufam as velas da alma de nossa existência. O dia em que não houver mais índios no nosso país, estaremos impossibilitados de viver e passaremos de navegadores dos mares da vida, para navegadores dos mares da morte. Somos todos embarcados deste sonho, onde pegamos uma carona dos nossos antepassados, de navegadores da liberdade para invasores inocentes numa só cara de da mais pura felicidade. Temos que ser gratos a Deus e a estes admiráveis portugueses sonhadores por nos deixarem este presente com tamanha diversidade para cuidar.

Carlos Alberto Potoko

 

Notícias Relacionadas

Os comentários são moderados. Para serem aceitos o cadastro do usuário deve estar completo. Não serão publicados textos ofensivos. A empresa jornalística não se responsabiliza pelas manifestações dos internautas.

Deixe uma resposta

Você deve estar Logando para postar um comentário.