Paternidade

“O amor de mãe é sublime, divino” e tantas outras coisas mais, dizem alguns poetas. E o amor de pai, seria menor? Não. São amores diferentes, com expressões diferentes em tempos e lugares diferentes. Claro que há homens que nem os alimentos asseguram aos filhos. Mas há, também, mães que apagam cigarros nos bracinhos dos filhos.

“Meu pai não me amava, não me dava carinho”, disse-me, uma vez, uma aluna. Ora, ela confundiu as coisas. E se, para ele, amar significasse não dar carinho? “Não dá muito carinho para teus filhos, para não estragar. Carinho é coisa de mulher, de mãe. Pai tem que dar dinheiro e educação”, pensavam, num passado não tão distante, alguns pais.

“Eu até que gostaria de ter abraçado meus filhos, mas fui educado a pensar que isso poderia lhes fazer mal”, disse-me um pai da velha guarda. Educação, para tais pais, significava preparar os filhos para o rigor da vida, para os conflitos tipicamente extradomésticos. “Carinho amolece a alma, não faz bem”, pensavam alguns. Em suma, era como entendiam o amor. Não davam carinho porque amavam, porque compreendiam o amor como educação ao rigor.

As coisas mudaram a partir da chegada das mulheres no trabalho extradoméstico, quando elas começaram a fazer coisa de homem. Mulheres fazendo coisas de homem; e homens que começam a fazer coisas de mulher: lavar louça, cozinhar e dar carinho aos filhos. Democratização das tarefas domésticas e extradomésticas. Nova compreensão dos papeis desempenhados por pais e mães no teatro da vida contemporânea.

Assim, hoje, quando há uma separação conjugal, os filhos não necessariamente ficam com as mães. “Eu cuidei com dedicação, não aceito que me digam que só posso ver meu filho uma vez por semana”, reclamam, com razão, os pais presentes na vida dos filhos, vitimados, agora, por aquelas rancorosas ex-esposas que usam os filhos para se vingarem dos ex-maridos. Claro que há muitos homens ausentes, repito, que nem os alimentos asseguram aos filhos. Mas, no caso dos pais presentes, a avaliação deveria ser diferente.

Quando eu casei, não morria de vontade de ter filhos. Gostava da minha vida a dois, com minha esposa. Na praia, lendo tranquilamente, eu via, horrorizado, aqueles pais que corriam de lá para cá, tirando baganas de cigarro da boca de seus sorridentes nenês que engatinhavam pela areia comendo de tudo (eca!). Minha esposa, ao contrário, queria porque queria ser mãe. Bem, por causa dela, aceitei o que para mim significava o sacrifício do meu eu por uma causa maior. Ainda bem que mudei de ideia. Nossas filhas são a melhor experiência que já tive em toda a minha vida. “A paternidade é sublime, divina”, digo eu, hoje. “Olha”, falei para a minha esposa, “tu também deve dizer não, para que elas não cresçam com a ideia de que eu sou o que diz não e tu a que diz sim”. Em suma, compartilhamos o lado doce e o lado rigoroso da educação, do amor que cuida. Quanto ao carinho, não tenho escrúpulos. Abraço e beijo nossas filhas várias vezes por dia. Vai ver que é por isso que, quando faço uma cara feia, elas logo, logo me entendem. Em suma, o rigor bom exige carinho, afeto como pressuposto obrigatório do amor. A maternidade é linda, maravilhosa, mas a nossa experiência intrafísica de paternidade também não é pouca coisa não. Quanto aos homens que nem os alimentos pagam aos seus filhos, bem, eles não sabem o que estão perdendo. Uma pena, perda muito mais para eles do que para seus filhos.

 

Fábio Régio Bento

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