Generalidade

A aplicação da chamada “letra fria da lei” em questões para as quais se espera um olhar mais sensível, capaz de reconhecer os verdadeiros interesses sociais e de identificar as características de convivência cotidiana, mais uma vez impõe às autoridades e lideranças municipais uma preocupação muito especial sobre o risco de que venha a se estabelecer, a curto prazo, um novo abalo na convivência fraterna que torna a fronteira Livramento-Rivera um exemplo para o mundo. A proibição pura e simples, ainda que amparada na formalidade da lei e dos acordos bilaterias, da entrada no Brasil de produtos de origem agropastorial, com certeza a curto prazo vai provocar reflexos que serão sentidos pelo tradicional comércio específico de produtos uruguaios no centro de Rivera. E, naturalmente, essa ação vai provocar uma reação – espera-se que compreensiva o suficiente para não retaliar. Não é de hoje que se questiona, na Fronteira, os reflexos negativos da generalidade das leis. É certo e justo que ela deva dirigir-se a todos os indivíduos, indistintamente, que tenha como destinatário um número indeterminado de pessoas, não se estabelecendo para um indivíduo ou um grupo específico. Mas, igualmente, sabe-se que a própria excepcionalidade da regra da generalidade prevê as leis singulares, aquelas que estabelecem normas especiais ou que instituem um privilégio em benefício de determinada pessoa ou grupo de pessoas, atendendo geralmente a situações pontuais. Pois é a reivindicação que se faz há décadas, na Fronteira: que as autoridades em Brasília, Montevidéu, Buenos Aires, enfim, observem com maior cuidado as características de fronteira. Se já se prevê novidades como a identidade de fronteiriço para o exercício profissional, o apoio mútuo em ações de socorro, a integração efetiva na área da educação, enfim, por quê em outros aspectos ainda não se consegue vislumbrar uma solução mais célere? Obrigar um consumidor – seja ele turista ou morador da Fronteira – a fazer todo um procedimento burocrático de importação ou simplesmente deixar de comprar um pote de “dulce de leche” ou um queijo do comércio riverense por causa de uma lei feita para controle de trânsito de produtos em grande escala é no mínimo ignorar um “modus vivendi” muito específico, muitas vezes até mesmo invejado por povos de diferentes lugares do mundo. Pior, ainda: é ignorar também o risco de que, diante da aplicação de uma legislação tão genérica, feita com certeza para regular os milionários negócios do Mercosul (leia-se São Paulo, Montevidéu, Buenos Aires…), se acabe prejudicando ainda mais o já fragilizado comércio de fronteira, entre Sant’Ana do Livramento e Rivera.

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