Familiares e Bombeiros divergem

A famíila alega que a demora no atendimento pode ter sido crucial para o caso, que culminou na morte do homem de 51 anos. O comando do Corpo de Bombeiros contesta a versão e abriu sindicância para apurar o caso

Sexta-feira, 12 de abril de 2013, enquanto muitas famílias santanenses se preparavam para dormir, outros se reuniam com amigos, iniciando as atividades de fim de semana na zona central da cidade. A rotina normal de muitos cidadãos acabou se completando sem que soubessem que, em algum lugar de Livramento, uma família em desespero tentava de todas maneiras salvar seu patriarca, e que alguns minutos após o primeiro pedido de socorro, a morte do homem aconteceria. Assim, o fato expôs um problema crônico vivido por muitas famílias santanenses e que se transforma em um quebra-cabeças de difícil solução.

Era noite de sexta-feira e um dos programas que a família de Sidinei De Oliveira Sales, 51, estava assistindo, acabou. O ritmo normal da residência apontava para um fim de noite tranquilo, apesar da impossibilidade de deslocamento de Sidnei, que estava há quinze dias acamado, se recuperando de uma cirurgia feita para colocação de próteses na altura do quadril. De repente, um grito sufocado. “Ele me chamou e disse: ‘Amor, estou passando mal… com uma dor no peito’. Nesse instante, ele puxou a gola da camiseta e começou a suar muito pelo corpo todo, sempre repetindo a mesma coisa: ‘Eu nunca senti isso’”, contou a esposa Denise Rodrigues Sales. A partir daí, uma sucessão de fatos põe em xeque a eficiência dos serviços de saúde que são prestados no município, e que não conseguiram, segundo a família do homem que veio a falecer alguns minutos depois de passar mal, dar a resposta eficiente aguardada.

Na tarde de ontem, os familiares receberam a reportagem do jornal A Plateia e fizeram pesadas críticas à atuação do Corpo de Bombeiros que, na ausência da SAMU – Serviço de Atendimento Médico de Urgência, foi quem prestou o atendimento. De acordo com o relato da filha da vítima, Adriana Rodrigues Sales, 30 anos, por volta das 22h40, foi feita a primeira ligação telefônica para o Corpo de Bombeiros. “Em resposta, a pessoa que me atendeu disse que esse serviço não era feito por eles, e desligou. Aí liguei para o SAMU, e a moça que me atendeu passou com o médico, que respondeu o seguinte: ‘Minha querida, não tem ambulância na cidade’, e desligou também. Como não sabíamos o que ele estava tendo e, ao mesmo tempo, ele apenas pedia para que tivéssemos cuidado com a cirurgia feita há quinze dias, fomos entrando em pânico, porque ele estava imóvel. Aí liguei de novo para os Bombeiros, que repetiu que esse não era o serviço deles. Liguei, então, para a minha tia, explicando que ninguém queria vir aqui em casa para socorrer o meu pai. Eram 23h09, quando liguei para o SAMU pela segunda vez. Antes de ligar para o SAMU, liguei para o 190, e eram 23h08. Disse que meu pai estava morrendo em cima da cama e os bombeiros não queriam vir aqui, e o atendente me pediu para seguir tentando, o que eu fiz de minuto em minuto. Nesse meio tempo, meu tio chegou, viu meu pai e saiu com o carro voando, e foi até o quartel do Corpo de Bombeiros, para buscar pessoalmente auxílio. Hoje, eu ouvi o Coronel Burgel dizer que os Bombeiros saíram do quartel às 23h12 para ir até a minha casa, sendo que a chamada que fiz para eles foi às 23h17, e eu tenho essa chamada registrada aqui no meu celular para provar”, explicou ela, mostrando o aparelho, comprovando o que estava falando. “Se eles tivessem saído às 23h12 do quartel, nesse horário eles já estariam na minha casa, e meu pai teria chegado mais cedo ao hospital. Eles nem tocaram no meu pai quando chegaram, parecia que estavam com nojo. Quando saíram daqui, meu irmão e minha mãe estavam com meu pai. Meu irmão é quem foi massageando o meu pai o tempo todo. Meu pai morreu nos braços do meu irmão, antes de chegar à Santa Casa de Misericórdia”, revelou Adriana.

A esposa e o filho, Anderson Rodrigues Sales, 20 anos, acompanharam os últimos momentos de vida de Sidinei Sales, no interior da ambulância de resgate do Corpo de Bombeiros.

 “Ocorrência não deveria ter sido atendida pelos Bombeiros”, diz comandante do 10 °CRB

Celular comprova a hora da última chamada ao Corpo de Bombeiros

Procurado pela reportagem do Jornal A Plateia, o comandante do 10° CRB – Comando Regional de Bombeiros, em Livramento, Tenente Coronel Pedro Ricardo Maron Burgel, disse que a missão constitucional, regrada por normas, determina os tipos de ocorrências que serão atendidas pelo Corpo de Bombeiros. “Esse caso, do pai da senhora Adriana, não é típico de ocorrência do Corpo de Bombeiros. Para isso, existe o SAMU, ou mesmo uma ambulância da Santa Casa, ou da Secretaria de Saúde, enfim. A gente precisa deixar isso claro. Nós costumamos atender essas ocorrências quando o serviço apropriado não tem condições, dentro das nossas possibilidades. Temos um exemplo do mesmo tipo de serviço, que era feito em Uruguaiana. Em uma dessas chamadas, a ambulância de resgate acabou se acidentando. Era uma ocorrência similar a essa, que não era típica do Corpo de Bombeiros e a cidade ficou dez meses sem o serviço. Agora, isso não é mais feito lá. A gente tem que deixar bem claro isso. Dessa ocorrência, a gente sabe, e tem que deixar claro, que qualquer um de nós perde a noção de tempo, e um minuto, nessa situação, acaba virando dois. Não estou dizendo que ela está aumentando o tempo, mas o desespero causa essa sensação. Foi feito um primeiro chamado, em torno de 23h e 23h12. Quando ela retornou a ligação, foi deslocada a viatura para prestar o atendimento”, afirmou o comandante.

Sindicância

O comandante do Corpo de Bombeiros informou que foi aberta um sindicância para apurar o caso. “Um sindicância policial militar vai buscar todos os fatos, como a hora da morte, que, aliás, só quem pode atestar é o médico. O que os servidores nos passaram é que ele teve uma parada cardíaca a uma quadra da Santa Casa, mas adentrou ao atendimento ainda com vida. Agora, vamos apurar todos os dados que estão sendo repassados e, em um prazo de vinte dias, o resultado desse documento, que é público, vai ser apresentado para a comunidade”, explicou. Ao longo da entrevista, o comandante Burgel fez questão de dizer que o que estava ao alcance dos soldados foi feito, mas mesmo assim os fatos serão apurados. O comandante ressaltou, também, que a viatura de resgate do Corpo de Bombeiros não está destinada a esse tipo de atendimento. “Esse veículo deveria atender apenas a ocorrências como de pessoas presas em ferragens, desaparecidas em encostas, e coisas do gênero, mas aqui na cidade não é o que acontece”, afirmou.

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1 Comentário

  1. Jacqueline Vargas

    Não importa quem tem a obrigação, o que importa é tentar salvar uma vida, tenho pena de quem se negou a ajudar estando tão perto, pois é sinal de que não tem amor ao próximo… é um ser que não podemos chamar de humano

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