O inimigo oculto

O assunto para reflexão dominical evoca o Direito, especialmente no que tange aos homens públicos e as críticas às quais, por dever de ofício, devem estar sujeitos. Devem, nesse particular, adquirir o sentido de dever, pois dialoga com o puro exercício do uso da cidadania, por intermédio da opinião, para tornar plena a liberdade de expressão.
É possível concluir que o homem público, de forma notória e especial, o agente político dententor de mandato eletivo, deve estar sujeito à crítica.
Há, porém, sobretudo nos cargos em comissão e funções de confiança, quem, pelo temor de perder “o emprego”, arrependendo-se de tentar defender o indefensável, julgue estar acima ou além de outrem, tendo como obrigação blindar, proteger, quem está acima, no que tange a informações e críticas. Tal manipulação é buscar minimizar ou fazer ouvidos moucos às verdades contidas na essência popular. Seja qual for o meio empregado, mais do que direito do cidadão, é seu dever fazer a crítica, na forma que entender melhor à posição, ao plano, à atitude do agente público e, mais ainda, considerando grau mais elevado, fazer com que este tome as providências necessárias para resolver as demandas que fazem parte do cotidiano das pessoas, pois é esta uma função precípua.
Citável, sobremaneira, o mestre e doutor Guilherme Döring Cunha Pereira, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo ao oferecer a definição sobre liberdade de crônica, isto é, liberdade de narração de fatos; liberdade de opinião (latu sensu), subdividida em: liberdade de crítica (ou liberdade de opinião stricto sensu), isto é, a liberdade de manifestar a opinião acerca de fatos, pessoas, instituições etc, liberdade de expressão de ideias, isto é, liberdade de manifestação de convicções mais gerais, doutrinas, concepções, teses etc.
Há entendimentos de que a crítica propriamente dita tem disciplina diversa daquela da crônica. A questão não está sob o crivo da verdade ou da inverdade, pois isso não pode ser examinado quando se trata de liberdade de opinião. Opinar é expressar, acusar a não realização de determinada ação ou a não tomada de certa atitude é constatar, perceber, não concordar. Cada qual tem a sua verdade, crítico, criticado e todos os demais quantos sejam cientificados da crítica. Porém, pode ocorrer que nenhuma delas seja a real, da mesma forma que é possível que todas o sejam.
De fato, correndo o risco de que pelo preciosismo, excesso de zelo e desconsideração do que esteja ao redor, o homem público acaba sendo blindado, afastado da essência do cotidiano das pessoas, por isso, a capacidade de ouvir torna-se um dos indispensáveis pressupostos para o exercício da função pública.
Esse afastamento, essa discordância em relação a ser criticado consiste em estimular o inimigo oculto que reside, inclusive, no próprio sistema ao redor do homem público.
Esse inimigo, normalmente, está dando tapas nas costas, parabenizando até pelo agente público ter ido ao banheiro: “que baita obra, chefe!”. É o que transfere para os outros, sob medo de perder o que acha ser poder, ou, mais propriamente “a boquinha”, ou o emprego, toda e qualquer responsabilidade, ao mesmo tempo em que faz alegações alongadas de realizações, ações, necessidades, porém, desprovido de convicção por não ter condições de cumprir com os estágios necessários até alcançar a solução ou soluções desejadas.
É o inimigo oculto, capaz de colocar tudo a perder por ter a dimensão de olhar para a própria barriga, ao passo em que simula interessar-se pelo que ocorre e pelo cotidiano administrativo, não porque deseja só benefícios apenas para si. Mas por não querer mudança ou inovação pois isso seria jogar contra o próprio patrimônio, ou seja, não haverá mais utilidade em sua permanência ao desempenhar a atividade que realiza.

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