O intocável direito de expressão

Estranha-se que setores do poder público, diante de uma tragédia que abalou a sociedade gaúcha , nacional e internacional, comecem agora a policiar até as manifestações verbais ou escritas sobre o terrível e lamentável episódio.

Se alguém tem que estar revoltado com o que houve são as famílias e a sociedade, e não o poder público, que não cumpriu preventivamente e rigorosamente com o seu dever. As famílias enlutadas e a sociedade têm todo o direito de se manifestar, e a ninguém cabe policiar, calar ou amordaçar essa livre e democrática manifestação.

Não vai adiantar agora ficarem tentando calar a boca da sociedade. O pior já aconteceu. E embora os tempos da ditadura militar tenham passado, ainda tem gente, por trás da sua autoridade, querendo ser mais rigoroso censor do que foi o próprio regime militar, mesmo entre aqueles que o combateram.

A sociedade é formada por indivíduos de todos os níveis morais, mentais e intelectuais, isto é, por seres humanos. E se alguém erra ao fazer um comentário ou uma crítica, não pode ser tratado como um criminoso, perseguido, preso, condenado e punido, pois só uma pessoa alienada ou fora do juízo normal pode brincar com a tragédia alheia.

Por outro lado, ninguém deve esquecer que o poder público — com todo o seu aparato, suas autoridades e seus funcionários — é mantido pela sociedade que paga impostos e salários e tem todo o direito de reclamar ou se manifestar, quando as coisas andam erradas ou não funcionam.

A Constituição Federal assegura a todos o livre direito de expressão, desde ao mais humilde morador de rua, até ao figurão político ou ao investido de autoridade. Portanto, também estes, como pessoas, têm o direito de se manifestar verbalmente ou por escrito, e dizer coisas certas ou erradas, que podem ser aceitas ou repudiadas, mas jamais se aceitará passivamente, em pleno estado democrático de direito, uma ordem despótica e autoritária de perseguição e punição pelo fato de alguém, seja quem for, como cidadão, ter expressado o seu pensamento.

A sociedade democrática é feita de pessoas, idéias, palavras, debates, ações e realizações.

E se alguém não gostar, se sentir ofendido ou prejudicado, é um direito que lhe assiste tirar vantagem ou proveito de uma situação, acionar o ministério público ou contratar um advogado e entrar na justiça com um processo por ofensa, calúnia, difamação ou danos morais.

Mas, enfim, nada disso vai devolver a vida daqueles que se sacrificaram para alertar a sociedade e as autoridades de que algo deve ser feito, que valha mais do que palavras, para melhorar a consciência e o entendimento das pessoas e das instituições, a fim de que, acontecimentos trágicos e lamentáveis, como este, não voltem mais a acontecer, em nenhum lugar.

 

Luciano Machado

 

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