As leis e a origem da criminalidade

[(“La ley es telaraña / en my inorância lo explico / no la tema el hombre rico / nunca la tema el que mande / pues la ruempe el bicho grande / y solo enrieda a los chicos”. -- J.Hernández)] 

No princípio todos eram iguais. Não havia hierarquia. Ninguém mandava em ninguém. Não havia leis nem regras de comportamento. Só as leis da selva e da natureza. O homem e a mulher, assim como os animais, eram livres para ir e vir, tentar sobreviver, amar e reproduzir. Não havia maldade nem crimes de nenhuma espécie.

Mas um dia, isso há muito tempo, alguém resolveu desvirtuar as coisas e acabar com um direito que era de todos, o direito de existir. Esse alguém matou, e por ter matado, sentiu-se superior.

Então surgiu o poder, representado por um pequeno grupo, a quem os demais deveriam respeitar e obedecer. E surgiram as primeiras contravenções. E inspirado nas aranhas, o poder resolveu criar em torno de si teias ou leis para se proteger.

E o poder, que no princípio era uno e indivisível, foi dividido em legislativo, executivo e judiciário, e os representantes do poder viram que isso era bom e declararam que aqueles que desobedecessem ou violassem as leis seriam considerados inimigos da lei ou do poder.

E foram criadas as casas legislativas, as instituições e forças repressivas como instrumentos do poder para elaborar e fazer cumprir as leis, proteger o poder e seus representantes.

E foram instituídas penas e multas a serem aplicadas aos subalternos, adversários ou inimigos do poder. E foi dito que todos seriam ‘iguais perante a Lei’, quer dizer perante a Lei Maior, entendendo-se que ninguém seria igual perante as leis menores.

Entre as leis comuns ou menores — essas que servem para enredar os pequenos e deixar passar os grandes — estava a lei do trabalho escravo que vigorou por muito tempo. Depois foi abolida e substituída por leis sociais. Os gregos e os romanos foram sábios e bons legisladores e os seus princípios até hoje são lembrados, citados nos tribunais e adotados nos cursos de Direito.

Mas a coisa começou a ficar ruim alguns séculos depois, a partir do momento em que o poder legislativo passou a ser exercido por elementos semi analfabetos, despreparados e por aqueles que, ao legislarem, estavam sempre pensando em si e nos seus, em prejuízo dos demais poderes e da coletividade. E as leis, para o bem de alguns e para mal de muitos, foram se proliferando.

De modo que hoje vivemos enredados num emaranhado de leis de todos os tipos e para todos os fins, algumas antigas e salvaguardando interesses pessoais unilaterais, como é o caso, dizem, de uma lei em vigor desde a década de 40, que isenta os parlamentares do pagamento do imposto de renda sobre certas rubricas extra-salariais, lei essa que deveria ter sido revogada há muito tempo e que até hoje não foi por reiterada falta de quorum nas sessões das assembléias onde isso deveria ser votado. E de outras leis esdrúxulas que em seu teor concedem privilégios, protegem ou acobertam coisas mais nocivas do que úteis à sociedade.

E o mais trágico é que a própria sociedade que elegeu ou contribuiu para a eleição desses elementos, tem agora de aturar, acatar e respeitar o que eles lhe ditam e impõem goela a baixo.

Inconformados com essa injusta desigualdade social, legislativa, econômica e tributária, surgiram aqueles que achavam que não deviam se submeter a isso, que não tinham por que trabalhar de 8 a 12 horas por dia para ganharem um salário inferior e ainda serem obrigados a pagar, proporcionalmente, mais imposto do que a privilegiada casta dos legisladores. E recusando-se a trabalhar, começaram a roubar, assaltar e matar, no princípio sozinhos e depois em bandos, por isso foram chamados de bandidos.

E a criminalidade, outrora clandestina, restrita às classes menos favorecidas, acabou ganhando adeptos em todas as camadas sociais, sendo hoje plenamente reconhecida pelas autoridades como ‘o crime organizado’, com direito a voz e voto, eleição e representatividade no congresso nacional.

Luciano Machado

 

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