A oratória e o destino do mensalão

Ouvi atento, durante cinco horas, a leitura, pelo Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel, da peça acusatória dos 38 réus do mensalão (ou Acusação Penal 470, como queiram).

Sem nunca elevar a voz, produziu um documento consistente e bem estruturado, conforme o testemunho de vários juristas. E repetiu a frase: foi “o mais atrevido e escandaloso caso de corrupção do país”, atribuindo a José Dirceu a chefia da quadrilha.

Isso foi no segundo dia do julgamento.

No primeiro, o jurista Márcio Thomaz Bastos provocou o atraso de um dia no cronograma estabelecido pelo STF, por conta de uma questão de ordem. Uma jogada ensaiada entre ele e o ministro Ricardo Lewandowski. Thomaz Bastos falou de improviso, pedindo o desmembramento da ação penal, de tal forma que apenas os detentores de mandato, com foro privilegiado, fossem julgados pelo STF. E Lewandowski, na condição de revisor do processo, trouxe um voto escrito que levou duas horas para ser lido e, ao final, foi derrotado.

Na segunda-feira, trabalhei à tarde com os olhos na TV Senado. Era o dia tão esperado das cinco primeiras manifestações dos advogados de réus importantes, entre eles “pesos pesados”, como José Dirceu, José Genuíno, Delúbio Soares e Marcos Valério.

José Luis Oliveira Lima, advogado de José Dirceu, não precisou de uma hora, tempo destinado a cada defensor, para fazer um trabalho exemplar em favor de seu constituinte:

- Não há nenhuma prova, nenhum documento, nenhuma circunstância que incrimine José Dirceu – disse ele.

E concluiu parafraseando o procurador Roberto Gurgel. A condenação de José Dirceu representaria “o mais atrevido e escandaloso ataque à Constituição”.

Os defensores de José Genuíno e Delúbio Soares, assim como tem ocorrido com os demais denunciados, negam, sistematicamente, que tenha havido compra de votos.

Admitem apenas a existência de caixa 2, ou “dinheiro não contabilizado”, como proclamou desde sempre Delúbio, para justificar o recebimento de valores expressivos, por partidos, parlamentares e funcionários do governo.

A tática é clara: esse crime eleitoral está prescrito.

É difícil prever qual será a reação dos onze ministros do Supremo, diante das manifestações da Procuradoria e dos advogados.

Até que ponto serão sensíveis a esses argumentos?

Sabe-se que todos eles tem já seu convencimento sobre a ação penal e muitos já teriam inclusive seus votos redigidos.

Mas não é incomum que um ministro mude seu voto em pleno julgamento, diante de fatos novos ou diante de provas que os façam mudar de idéia. 

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Bons tribunos costumam produzir belas frases.

As duas melhores que li sobre esse julgamento vêm de velhas raposas do Direito:

1 – É verdade que a prova testemunhal é a prostituta das provas. Mas, quando um crime ocorre dentro do prostíbulo, a prostituta é a mais nobre das testemunhas.

2 – Joaquim Barbosa diz a coisa certa de maneira errada. Lewandowski diz a coisa errada de maneira certa.

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