O Rio dos meus encantos

Amo o Rio de Janeiro.

Tive o privilégio de conviver bastante com os cariocas da ”cidade maravilhosa” quando ela ainda não enfrentava alguns dos seus dramas de hoje.

Caminhava-se, à noite, em Copacabana, sem qualquer preocupação. E saboreava-se com tranquilidade aquela agradável brisa vinda do mar, “com cheiro de mulher”, como costumava dizer o “negro Moacir”. Não havia a imensidão de favelas de hoje, nem o tráfico de tóxicos assim escancarado, muito menos as temidas milícias policiais.

Foi no início da década de 70, quando assumí a direção da sucursal do Correio da Manhã, em Porto Alegre. E isso me obrigava a estar na sede da empresa, no Rio, quase todas as semanas.

Fundado por Edmundo Bittencourt, gaúcho de Santa Maria, o jornal nasceu em 1901 e fez história na imprensa brasileira, pelo tom crítico de seus editoriais.

Durante mais de três anos, conheci e convivi com alguns dos grandes nomes do jornalismo do país.

 

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O Rio daqueles tempos continuava a ser sinônimo de praia, mulher bonita e muita boemia, tudo emoldurado pelo mar e pelos morros, com desenhos de uma natureza soberba.

Ao final do expediente no jornal, perto da meia-noite, era quase inevitável que fossemos conversar e beber nos bares e restaurantes da zona sul, em Copacabana e Ipanema.

Conquistei grandes amigos por lá.

Um deles foi o gaúcho Moacir Souza, o “negro Moacir”, como todos o conheciam. Ele fora homem de confiança de João Goulart, havia ocupado cargos importantes durante o governo e, depois de 64, estava um tanto à deriva.

Socorreu-o a família Alencar, e Marcelo, então diretor do Correio, tinha-o como seu assessor. Marcelo Alencar, mais adiante, foi governador do Estado e, antes disso, nos idos de 64, um dos primeiros senadores cassados.

Formamos um trio de bons amigos.

E isso implica em responsabilidades.

Anos depois, já não nos víamos há algum tempo, recebi, surpreso, um telefonema de Marcelo Alencar, à época governador do Rio.

Informava a morte súbita do “negro Moacir” e me pedia um favor difícil: dizer à mãe dele, na capital gaúcha, o que havia ocorrido.

Cumpri a missão, às lágrimas.

 

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O Rio era isso. Emotivo, solidário, fraterno, amigo.

Foram tempos para mim inesquecíveis.

Éramos jovens, vivia-se um momento político importante, fazer jornal era uma tarefa complexa, mas fascinante, e as jornadas noturnas eram essenciais.

Não sei se é a cidade mais bela do mundo, até porque não as conheço todas. Das muitas por onde andei, não vi outra com natureza tão fascinante. O certo é que o Comitê do Patrimônio Mundial da UNESCO, reunido em São Petersburgo, na Rússia, no último domingo, transformou a ex-capital da República em Patrimônio da Humanidade, na categoria de paisagem cultural, pelo excepcional cenário urbano da cidade.

O Rio que eu amo merecia essa distinção há muito tempo.

 

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