PALACINHO

O Palacinho, na década de 70, foi um dos últimos redutos de ressaca da boemia santanense, freqüentado durante o dia e no final da tarde, e até certa hora da noite, para o pessoal fazer lanches ou tomar o seu delicioso cafezinho.

Era um ambiente acolhedor no verão, com seus sucos, refrescos, sorvetes (foi o pioneiro da banana split) e suas mesas na calçada; e no inverno, em seu interior, com sua añeja, sua ginebra, seus deliciosos licores, coquetéis, seu chocolate e outras bebidas quentes.

Entre os freqüentadores do Palacinho, além de mim, lembro o Miguel Angel e seu irmão José Marcos Gomes, o Amaro Silveira, o Glênio Grbac e seu pai Roque Pastore, o tabelião Gutierrez, o representante comercial Tomás Jorge Cano, o vice-cônsul espanhol Vicente Quadrado, o Atílio José Nodari e seu pai Romano João Nodari, o Amaro Cabeda Marques e o João Antonio Alvim.

Com referência ao João Antonio, não posso deixar de contar algo de suas proezas. O João era um guri grande. Uma das suas brincadeiras preferidas, nas filas de Banco, ou mesmo nos bares, por baixo das mesas, era amarrar entre si os cadarços dos sapatos dos seus amigos. Outra era rasgar um lenço de seda, quando algum deles, meio gordo, se abaixava para desatar os cordões dos sapatos, para que o sujeito pensasse que tinha rasgado a calça nos fundilhos. Nas filas de Banco, dava-se ao trabalho de se abaixar por trás de seus amigos distraídos e tamborilar-lhes os sapatos com uma caneta. O sujeito sentia aquela vibração nos pés, como se fosse um choque elétrico, olhava para baixo e não via nada. Voltava a olhar pra frente e o João tornava a lhe tamborilar os sapatos. O sujeito ficava intrigado, olhava para os lados, e todos o estavam olhando com ar risonho. Enquanto isso, o João morria de rir. Além disso, também era um irreverente. Estacionava o seu automóvel em frente ao Palacinho, de bico, e dali mesmo dava um assobio ou gritava para o Amaro Cabeda, que morava a cem metros, num apartamento de cima, na esquina da Sarandi, convidando-o para vir tomar uma cerveja ou um cafezinho. Todos ficavam olhando ele gritar e achavam que o Alvim era louco, mas ele não dava bola e até se divertia muito com o que os outros ficavam pensando a seu respeito, principalmente aqueles que não o conheciam nem sabiam que era apenas um grande gozador.

Apesar de ser um brincalhão incorrigível, o João Alvim era uma excelente pessoa, um grande irmão e amigo, que não media esforços para ajudar a quem dele precisasse.

Pois o João morreu prematuramente, durante uma viagem de ônibus, entre Porto Alegre e Livramento, vítima de uma crise de hipertensão. Dizem que vinha num inverno de madrugada, conversando com o motorista na cabine, quando o pára-brisas se partiu e uma aragem fria invadiu a cabine, pegando o João desabrigado, em mangas de camisa …

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Mas foi ali no Palacinho que aconteceu uma confusão que quase terminou em caso de polícia:

O proprietário do bar, seu Alcides, senhor de idade, tinha um fusca verde que sempre deixava obliquamente estacionado ali na frente.

Certo dia alguém estacionou ao lado do carro do dono do bar outro fusca verde, igualzinho, e entrou no Palacinho para beber algo.

Ao sair, o sujeito abriu a porta do carro, enfiou a chave na ignição, ligou o motor, deu ré, e foi-se embora.

No final do expediente, ao tentar entrar no seu automóvel, o dono do bar não conseguiu abrir a porta. Foi então, ao olhar a placa, que se deu conta que aquele carro não era o seu.

O homem já se dispunha a dar parte na polícia, dizendo que tinham roubado o seu automóvel, quando o outro apareceu. Havia acontecido o seguinte:

Ao chegar no Palacinho, o cliente havia colocado o seu molho de chaves, com três chaves, em cima do balcão, ao lado do Caixa, onde também estavam as chaves do proprietário do bar. Ao sair, em vez de pegar as suas chaves, o cliente pegou por engano as chaves do outro, que, coincidentemente, num chaveiro igualzinho, também eram em número de três.

Esta história nos foi contada por um dos antigos garçons do Bar Palacinho.

Por ter sido um dos últimos locais de encontro de amigos, no Largo do Internacional, como o Bar Rio Branco, o Marisol, a Cantina di Nápoli e o Café Tupinambá — o Palacinho também deixou saudades …

 

(Luciano Machado)

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