Da importância de saber piscar

Tenho razões pessoais para temer pela segurança. Difícil, aliás, caro leitor, alguém do nosso círculo de relações – teu e meu – que já não tenha tido um familiar ou amigo, ou conhecido, vítima de assalto ou de algum tipo de violência.

No meu caso, perdi o irmão mais próximo, além de sócio e amigo. Lá já se vão mais de vinte anos daquela madrugada quente de sábado, no verão de Santa Maria, quando três assaltantes o assassinaram. E a dor de sua morte nunca se foi.

Meu filho quer ir embora do Brasil. Teme pela família, em especial pelos meus dois netos. E não tenho argumentos para contrapor-me à sua vontade.

O noticiário é desanimador.

Vivemos cada vez mais enclausurados e com medo.

Reunião de condomínio hoje é sinônimo de debate sobre regras de segurança, em edifícios e condomínios. E se paga taxas cada vez mais elevadas para fazer o que é obrigação do Estado: assegurar um mínimo de tranquilidade às pessoas que trabalham e pagam uma carga tributária sem retorno. Em segurança, mas também em saúde e em educação.

Preparemo-nos que ainda não é tudo.

Em São Paulo, conforme reportagem da Folha no último final de semana, já não basta olhar nas redondezas, ao sair do edifício, para ver se há pessoas estranhas nas proximidades (quando você lembra disso); não é suficiente só permitir o ingresso de pessoas no condomínio depois de identificadas pelo morador e haver câmeras escondias para gravar quem entra e sai; não deixar chaves do seu apartamento com o zelador, o porteiro, etc.

Não. Agora é preciso mais.

Agora é indispensável prevenir-se conta os arrastões, como aquele acontecido aqui em Porto Alegre na última semana, num bairro da chamada classe alta.

E como fazê-lo?

É simples: revistando os moradores.

Sim, é isso.

Muitos condomínios passaram a adotar a providência que até aqui era reservada apenas a sofisticados edifícios da classe altíssima da capital paulista. Em Jardim, Perdizes e Moema, todos seguem o novo sistema: você chega com o carro de sua propriedade, no apartamento onde você mora, mas não entra sem antes passar por uma vistoria rigorosa dos seguranças.

Isso inclui parar o carro, abrir o vidro e permitir que verifiquem se, além do proprietário, há algum desconhecido no automóvel, no banco ou no porta-malas.

Se você tiver um convidado no seu veículo, azar dele. Vai descer do carro e entrar pela porta social, com direito a detectores de metal.

Estamos chegando, enfim, ao sonhado mundo de George Orwel: um olho a nos olhar permanentemente. Não importa nossa identidade, nossas circunstâncias.

Não pense, no entanto que, com mais essa providência, estejamos seguros.

- Em um condomínio nos Jardins – explica o capitão da Polícia Militar, especialista em segurança – se o morador estiver sob ameaça, ao abrir o vidro, ele dá duas piscadas para o controlador de acesso.

Então estamos combinados e é importante lembrar: em caso de perigo, pisque os olhos.

E assim vamos nós. Submetidos a tudo, inclusive a piscadelas.

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