CASAMENTO HOMOAFETIVO

Na noite de 29 de março de 2014, o Salão do Júri de Sant’Ana do Livramento foi palco de mais um julgamento. O corpo de jurados formados por juízes, testemunhas e madrinhas esperavam ansiosos pela dupla que seria sentenciada naquela noite. 
No momento de abertura da sessão, o nome das duas jovens ecoou pelo salão e elas entraram nervosas e ao mesmo tempo destemidas. Daniela e Mariana foram conduzidas passo a passo até o juíz como quem tenta adiar ao máximo uma sentença.
As testemunhas se levantaram e acompanharam com o olhar fixo para as duas que se dirigiram até a mesa e aguardaram a pergunta mais decisiva de suas vidas. Daniela e Mariana não relutaram e confirmaram diante do juíz um desejo que ambas já viviam há oito anos. Diante da resposta afirmativa, o juíz João Carlos Paixão não teve outra escolha a não ser chancelar o veredicto: declaro-vos CASADAS. 
Assim poderia ser feita a analogia da noite inédita que Livramento viveu. Embora o pequeno público, a beleza e a emoção da solenidade superam o espaço físico e os corações. Tudo foi perfeito em cada pequeno detalhe. Uma juíza de direito e uma promotora de justiça romperam o paradigma do pudor ignorante e de mãos dadas revestiram duas jovens como que com armaduras blindadas da Justiça. 
O belo vestido branco e as flores que Daniela usava não foram o destaque do primeiro casamento homossexual de Livramento, a elegância e choro de Mariana com a declaração do juíz de paz não foi o momento de mais emoção, pois não foi isso que se viu na noite do dia 29 de março de 2014. O que todas as quase cinquenta pessoas presentes na solenidade viram naquele momento de união entre duas mulheres foi a Justiça em sua imagem mais figurada e humana, despir-se e cegar-se diante do preconceito, outorgando para um casal como qualquer outro o direito de realizarem um sonho e de serem felizes, de poderem resguardar seus direitos como os demais 55 casais fizeram antes delas.
Quem acompanhou a cerimônia pode ver estampado nos rostos das autoridades, um nervosismo e ansiedade diferentes. Um salão antes usado para julgamentos de crimes contra a vida, naquela noite julgou digno, livre, legal e igual um amor de uma vida inteira. A bandeira colorida e símbolo da homoafetividade estendida entre as bandeiras do Estado do Rio Grande do Sul e do Brasil simbolizou o fim do exílio de um casal que viveu um amor considerado clandestino pela sociedade. 
Ao final, quem merece os parabéns? As noivas? A juíza de direito que destemidamente promoveu e apoiou a oficialização e publicidade de um amor encarado por grande parte da sociedade como feio, índigo e pecaminoso? Ou merecem os parabéns os olhares que condenaram a solenidade e ainda assim aplaudiram o casamento de Daniela e Mariana por formalidade? Merece os parabéns o público que prestigiou 55 casamentos e não se fez presente ao último e inédito da cidade? Quanto a este, imaginemos que compromissos e motivos de força maior não oportunizaram a participação, mas chega de encarar o preconceito, é hora de destruí-lo sem parabéns ou palmas. 
Competidores se encaram antes da luta, mas no fim, o combate deve acontecer para que haja um vencedor, neste caso, Daniela e Mariana lutaram, tiveram apoio e torcida e no fim saíram vitoriosas, pois encararam o preconceito e o derrotaram, elas merecem os parabéns. A luta foi pública desde o início e no grande dia, a justiça arrancou sua venda, olhou no fundo dos olhos das duas noivas e refletiu nas lágrimas delas a tão sonhada igualdade perante a Lei.

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