Saúde: está lançado o desafio

Nova titular da Saúde, Natália Ivone Steinbrenner, assume a secretaria com a incumbência de transformar em práticas o pensamento do governo no setor

O grande desafio. Para a nova secretária municipal de Saúde, Natália Ivone Steinbrenner, é uma função que parte da reorganização do sistema, passando pela implantação de programas como o ESF – Estratégia de Saúde da Família. Para os cidadãos, a questão é menos técnica: o atendimento precisa ser mais rápido e o acesso a ele menos sacrificado.

Ontem, durante o programa Jornal da Manhã, Natália Steinbrenner deu sua primeira entrevista à rádio RCC FM, expondo o que pensa e demonstrando conhecimento do setor. A questão, agora, é a implementação de forma a proporcionar os resultados que a cidadania, vivenciando o caos e a desesperança em muitas de suas necessidades, exige.

Para o prefeito Glauber Lima, humanização é fundamental e foi essa a determinação dele, que confirmou estar acompanhando pessoalmente as ações, com a secretária. Confia a síntese da entrevista realizada ontem, no programa jornalístico matinal da emissora.

Natural de Porto Xavier, vinda da fronteira com a Argentina, já trabalhou em vários municípios, na área hospitalar, como em Santa Rosa. Quando começou sua caminhada na área da saúde, Natália Ivone Steinbrenner partiu para a formação em gestão do setor. Foi coordenadora regional de saúde, entre 1999 e 2002, no governo de Olívio Dutra, da 9a CRS de Cruz Alta. Informa ter trabalhado como secretária nos municípios de Salto do Jacuí e Cruz Alta (onde a pasta é Saúde e Desenvolvimento Social). Salienta que é docente do curso de planejamento e programação dos sistemas locais em saúde em nível de pós-graduação. “Minha trajetória está voltada na área de gestão e agora estou aceitando este desafio, a convite do prefeito Glauber, para coordenar os trabalhos da pasta” – complementou.

A Plateia – De que tamanho é o desafio?
Natalia - Na verdade, a gente percebe que a partir do Sistema Único de Saúde, implementado através da Constituição Federal de 1988, muda-se todo um conceito de saúde pública e uma concepção de como se tem que trabalhar saúde pública num tripé. Até esse momento, tínhamos no Brasil cidadãos de primeira e de segunda classe – as carteirinhas, inclusive, eram de cores diferentes – e tinha direito à saúde pública quem era contribuinte do sistema previdenciário. Significa que era somente quem tinha carteira assinada ou seus familiares. Os demais eram atendidos nos hospitais filantrópicos, nas santas casas, como indigentes. Houve todo um movimento importante no Brasil, que culminou com o movimento sanitarista e com a 8ª Conferência Nacional de Saúde, em 1986, na luta de mudar não só o conceito – que passa a ser direito de todos e dever do Estado – mas também mudar a forma e o modelo de atenção. Que fosse universal, para todos. Na Constituição de 88, se garante isso. A partir disso, começa todo um desafio de descentralizar o sistema público de saúde para os municípios, e cada um precisa organizar seu sistema local de saúde nesse tripé: da prevenção de doenças, da promoção de saúde e da recuperação. Naquela época, o que tinha como foco: a hospitalização, a medicamentalização e a figura do médico. A partir do Sistema Único de Saúde se passa para uma outra concepção, que é a equipe multiprofissional. Cada profissional na área de saúde passa a ser tão importante quanto o médico, que continua tendo sua importância naquilo que só ele pode fazer, mas entra toda uma concepção da saúde preventiva, que trabalha também com outros profissionais, o enfermeiro, o nutricionista, o educador físico, o odontólogo; então, tem toda uma outra concepção. Baseado nisso, qual o grande desafio de Sant’Ana do Livramento? Pela grande extensão territorial que tem, inúmeros assentamentos, é um município com características diferentes dos que eu venho trabalhando até agora, pois eram municípios que tinham uma maior população, concentrada em zona urbana. Então, o grande desafio é reestruturar mesmo o sistema público de saúde, a partir dos indicadores de saúde, da real necessidade da população – que ela vem expressando nas assembléias do OP, nas audiências públicas, nas reuniões do conselho de saúde e, a partir disso, ter como foco mudança do modelo assistencial para atenção primária em saúde como a grande porta de entrada. Nosso prefeito Glauber tem isso como estratégia e temos pensado no ESF, ampliando os agentes comunitários e tentar, aos poucos, gradativamente, ir constituindo o programa de Estratégias de Saúde da Família, que vai atender uma região restrita de, no máximo, 4 mil habitantes, cada equipe composta por médicos, enfermeiros, odontólogos e os demais profissionais, descentralizando os serviços de promoção e prevenção; como o teste do pezinho, o pré-natal, as vacinas, o preventivo, os grupos de gestantes, diabéticos e hipertensos, os acamados. Então, ele muda todo um perfil, no qual a gente previne muito mais doenças e acaba indo para o hospital, de fato, a pessoa que precisar da recuperação da saúde. A promoção estamos fazendo na atenção básica. Esse é o grande desafio: gradativamente ir implementando essas ações, para que a gente tenha mudanças nos nossos indicadores de saúde.

A Plateia – Quais as prioridades? Qual o diagnóstico de Sant’Ana do Livramento e o que lhe preocupou?
Natália - No diagnóstico que ajudei a levantar, pois vim para cá com esse desafio, de fazer o diagnóstico da saúde no município, e acabei virando secretária na semana passada, o que percebo? Insuficiência orçamentária, muitas obras em que foram captados recursos para construir, mas que não têm um orçamento suficiente para dar conta e cobertura de todas elas. O desafio é dar prioridade para todas essas obras e também fazer concurso público. O problema é que quando a gente começa a trabalhar por muito tempo só com contratos emergenciais, vai renovando e terceirização, quebra a continuidade, o que é uma coisa ruim, porque não cria um vínculo entre a comunidade e os profissionais de saúde. A gente precisa que o técnico, lá na ponta, também seja oriundo de concurso público, e possa seguir fazendo a política de humanização, o processo de educação continuada, que é importante e vai criando o vínculo com sua comunidade descrita. Por isso, a importância do médico de 40 horas, da Estratégia de Saúde da Família, pois quanto mais tu confias no profissional, no médico, e na equipe da família, é mais fácil tratar o problema de saúde, pois o próprio profissional conhece tua história clínica e antecedentes que geram algumas doenças do paciente – pois, às vezes, são antecedentes familiares – e fica mais fácil o tratamento. O grande desafio é aportar num modelo de atenção básica, agilizar o processo de implantação da ESF, do processo seletivo dos agentes comunitários de saúde; organizar bem a questão do pré-natal, a saúde da criança e da mulher. Eu sempre digo que a vida começa na criança, na barriga da mãe. Precisamos qualificar o pré-natal e a prevenção das doenças e também, claro, a área hospitalar, mas aí, naqueles moldes que já referi, no que de fato precisar do hospital. Outro grande desafio mesmo é evitar que pessoas que possam ser atendidas na unidade básica durante o dia vão ampliar as filas de espera no pronto atendimento, à noite. O município tem mais de 84 mil habitantes e mais uma população que mora no Uruguai que acessa o serviço aqui, então, talvez, nossa população atendida no SUS passe dos 100 mil habitantes. Dá essa impressão. É a população flutuante e não temos hoje, estrutura suficiente e unidades montadas para essa população, para os até 4.000 habitantes que é o preconizado para cada equipe atender, no máximo, para ter um trabalho de qualidade.

A Plateia – E o foco, agora?
Natália - Nós precisamos, neste momento, estruturar muitos serviços. É muito dificil qualificar se não tem a estrutura mínima, então temos que correr muito para chegar a isso. Equipar, fazer concurso público, capacitar trabalhadores e ainda prever no orçamento o custeio para que esse serviço não seja interrompido.

A Plateia – E os prazos? A partir de quando haverá redução de pessoas pernoitando em busca de atendimento? A partir de quando haverá disponibilidade de médicos especialistas, pediatras, obstetras, ginecologistas, enfim, entre outros?
Natália - O grande desafio é agilizar as obras em andamento. No Armour, há a obra da UBS, acredito que em dois meses e pouco possa se estar inaugurando-a, não a obra, mas o serviço que a gente precisa colocar à disposição da população. Lá estarão baseadas três equipes de Estratégia de Saúde da Família, que vão atender em torno de 10 mil pessoas. Aí, já começa um novo modelo que será nosso projeto piloto na área de estratégia da saúde, onde temos bom financiamento do governo federal e do estadual. Já virá mais recursos, e aí a gente vai poder ir qualificando. Paralelo a isso, há uma outra obra, na Santa Rosa, que terá duas Estratégias – vai demorar um pouco mais, creio uns seis meses até a conclusão. Serão mais duas equipes e aí começaremos com um novo modelo, que vai nos dar os parâmetros e, gradativamente, teremos que pensar no orçamento, pois é como a casa e o salário da gente. Tem que pensar e gastar dentro do que ganha. Essa preocupação temos que dividir com a população, porque o orçamento é finito também, e nós vamos captar recursos dentro dele, habilitando o município a projetos do governo federal e do Estado, para que se possa trabalhar esse recurso. Mas nós sempre temos que trabalhar com o limite orçamentário. Aí, nesse limite, vamos elencar prioridades. Esta semana é muito de planejamento, de sentar com as equipes de saúde, enfermeiras, médicos, profissionais que respodem pela saúde pública na ponta e vamos ver como, já nesse momento, poderemos ir qualificando.

A Plateia – Com relação ao recurso de R$ 1 milhão e 400 mil para a Unidade de Pronto Atendimento (Upa) do colégio Silvio Ribeiro, como ficou?
Natália - Esse recurso entrou no ano de 2010. A obra já deveria ter sido concluída, já deveríamos ter um pronto atendimento 24 horas municipal no local, para atender a baixa e média complexidade de urgências e precisar só da emergência da Santa Casa. Como não tem, esse recurso está parado, já encaminhamos e retornamos o projeto para a Seplama, para os engenheiros e arquitetos realizarem a readequação e, o quanto antes, estarmos licitando essa obra. Ela já poderia ter sido concluída e inaugurada. Nós corremos contra o tempo, agora.

A Plateia -Como vê e como espera que sejam as relações com a Santa Casa? E o PA, o pronto atendimento, que é do município?
Natália - O hospital Santa Casa não é um estabelecimento isolado, faz parte da rede de saúde do município. Dentro da rede, trabalha com os próprios e os contratados. Tem vários prestadores contratados, para exames laboratoriais, de imagem e outros procedimentos. A Santa Casa é mais um estabelecimento de saúde contratualizado pelo governo estadual e também conveniado com o município para prover o Pronto Atendimento. Vejo que tem que ter uma relação muito fraterna entre todos os que trabalham na saúde pública. Trabalhando fragmentada, a saúde só prejudica a população. Vejo que há uma boa e longa caminhada de diálogo e construção, para que a gente possa qualificar o sistema.

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