Os dois lados da venda de veículos

Tudo tem dois lados – assevera um dito popular. A notícia sobre o recorde alcançado na venda de veículos em abril confirma o adágio.
Os números mostram que a comercialização teve alta de 17,5%, com uma quantidade de emplacamentos que saltou de 283.900 em março para 333.750 em abril. Na comparação com 2012, o crescimento chega a 29,4%. O balanço foi apresentado pela Federação Nacional da Distribuição de Veículos Automotores (Fenabrave).
O resultado é recorde para o mês de abril e para o acumulado, superando os resultados de 2011. De janeiro a abril, as vendas totais de veículos chegaram a 1.164.173 de unidades, expansão de 8,19% sobre o mesmo período do ano passado, com 1.076.083 emplacamentos.
Claro que o resultado é positivo no sentido de apresentar uma interessante movimentação econômica, indispensável diante da baixa expectativa de crescimento e do cenário da crise financeira internacional. Basta ver que não foi só a venda de veículos leves que cresceu. Os setores de caminhões e ônibus, juntos, somaram 9,43% entre março e abril – crescimento de 30,63% na comparação com abril de 2012. No acumulado, houve alta de 1,86%. A produção, claramente, dá sinais de vigor.
Porém, o “outro lado” da notícia vem com a questão que atormenta cada vez mais a vida dos brasileiros de todas as classes sociais: a incapacidade estrutural do Brasil para receber tantos veículos. É um problema que diz respeito às rodovias, mas também às cidades. O caos urbano causado pelos congestionamentos só tende a aumentar – e numa velocidade cada vez mais exponencial.
A questão é: até onde isso vai? Como lidar com esse aumento de automóveis em nossas vias? Que alternativas são construídas ou ao menos pensadas? A situação é preocupante, basta estar nas ruas cotidianamente para saber. Estamos muito perto, inclusive em cidades médias, de uma situação de paralisia no trânsito em horários de pico. E, do ponto de vista econômico, isso também é prejudicial e improducente.
Precisamos pensar em alternativas urgentes – e agir. Sequer faço referência aos investimentos nos demais modais: ferroviário, aeroviário e portuário. Esse é um nó estrutural, que dialoga com décadas de atraso, e cuja reversão exigirá uma demorada mudança de cultura e de prioridades. Uma dinâmica não impede a outra. Sem deixar de priorizar essa perspectiva, precisamos ver o que está ao alcance no plano imediato.
Na Europa, por exemplo, diante da crise, os governos também incentivaram a venda de automóveis. Só que, ao mesmo tempo, motivaram o consumidor para a entrega do veículo antigo, os quais saíram das ruas. Muitos deles viraram sucata e foram reciclados. É uma medida que movimentou a economia e, ao mesmo tempo, introduziu práticas responsáveis de sustentabilidade e de segurança no trânsito.
A inspeção veicular, que ainda não vigora adequadamente no Brasil, pode ser outro caminho. Não é difícil constatar que temos muitos carros trafegando sem condições. Também nesse caso, além do trânsito, a ação teria implicações na diminuição da poluição e no aumento da segurança. Outro caminho viável é a construção de ciclovias, especialmente em regiões urbanas planas. Locar bicicletas públicas já se mostrou algo eficaz no mundo e até mesmo em cidades brasileiras.
Numa sociedade de consumo, é ilusória a ideia de contrariar frontalmente a demanda. Nesse caso, não se pode exigir a intervenção estatal para o fim da compra dos automóveis. Até porque, como se vê, o setor automobilístico é um importante mobilizador econômico. Porém, precisamos relativizar o lado negativo dessa ascensão, diminuindo ou mitigando o impacto no meio ambiente, na segurança do trânsito e na trafegabilidade das nossas estradas e vias urbanas.

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