A maior casa do mundo

Em um canteiro de obras, o arquiteto entrega para duas crianças um balde com argamassa, a colher de pedreiro e coloca perto uma pequena pilha de tijolos. Olhando para as meninas, diz:
– Construam a maior casa do mundo!
O arquiteto era meu pai. As crianças, eu e minha irmã.
Doces lembranças de um pai pronto a acompanhar as filhas e incentivar. Por diversas vezes, nos levava ao seu trabalho no escritório e em visitas às obras, assim, aprendemos a valorizar a utilidade de um ofício e nos sentíamos prestigiadas.
Um pai que nunca reclamava do serviço, concluía à noite, na sala de jantar, suas plantas de arquitetura diante de nossos olhos curiosos, para poder ficar junto à família. Já vi muita casa aparecer e crescer em traços precisos da caneta de nanquim.
A paternidade é algo muito especial mesmo, a tarefa difícil de fornecer o material aos filhos, as ferramentas, proporcionar os meios e deixá-los orientados para fazerem por si mesmos.
É impor limites sabendo que é fundamental rir e brincar.
É doação. Trocar o programa preferido da TV pelo desenho animado do ursinho, o cowboy espacial, a princesa de cabelos longos, e ainda segurar o filho antes que ele caia do escorregador.
O pai é capaz de verdadeiras mágicas. Quando coloca o filho nos ombros, a criança ganha altura, tamanho, e sente-se uma heroína do faz-de-conta, como a das historinhas que ouve ou lê. Assim, o genitor resolve em segundos o que a mãe poderia demorar bons minutos.
A paternidade é o preocupar-se em silêncio, o vigiar sem ser percebido, o alimentar o futuro de seus descendentes, como quem lê aquele bom livro ou assiste ao filme inesquecível, como se fosse um sonho em constante renovação a cada linha, em cada troca de cena. Pois o bom pai se realizará com as realizações de seus filhos: a sequência de seus desejos, a herança em olhos atentos e felizes.
No decorrer de nossa vida poderemos não ter construído a “maior casa do mundo”, mas com certeza terá chão firme, paredes erguidas, telhado para nos proteger e a quem a habitará depois, se contarmos com a presença de um pai que nos dê segurança, incentivo, boas lembranças, demonstrações de afeto e o mais franco sorriso. E ainda por cima, quando ao fim de nosso trabalho, mostrando a pilha torta de tijolos, ele disser:
– Perfeita! Esta é a maior casa do mundo!

*Ana Cecília Romeu
*Publicitária e escritora

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1 Comentário

  1. Luciana Santa RIta

    Oi Ana Cecília,

    Tudo bem? Parabéns por mais essa crônica. Sempre acompanho as suas publicações no Jornal “A Plateia”.

    Em tempos de relações frágeis, percebo a relação paterna como fundamental para se construir o alicerce da vida.. E , concordo com você que a paternidade é vigiar em silêncio.

    Penso que a maior herança será a construção de um adulto com um perfeito equilibro das emoções. E, em sentido figurado, a maior casa será  o legado de amor e cuidado entre as gerações.

    Luciana

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