Eu choro com cebola

Em alguns momentos somos obrigados a assumir uma tarefa que não gostamos, ou não temos habilidade. Foi o que me aconteceu quando o cozinheiro oficial da casa esteve ausente.

Para além das tarefas comerciais e/ou profissionais, as coisas banais, aquelas que enfrentamos no nosso dia-a-dia, como cozinhar, também requerem o gosto e a aptidão. Assim existem os bons cozinheiros, os maus cozinheiros e os que não gostam de cozinhar, mas tentam. Encaixo-me neste último grupo, os que cozinham para sobreviver, e ainda sendo um exercício de humor e confusão tirei algumas reflexões dele quando chorei por minutos ao cortar uma única cebola.

Penso que em tudo o que conseguimos um resultado positivo está sempre um ingrediente: a paixão por executar tal coisa. O processo se torna mais espontâneo e natural quando temos interesse pela tarefa, seja ela cozinhar, escrever, dirigir, ou mesmo, a aptidão vocacional que nos faz ser mais hábeis para determinada profissão.

Creio que nem sempre a dificuldade no “modo de preparo” da tarefa, indica o resultado que sai quentinho do forno. Um bolo delicioso pode ter sido fruto de uma que outra atrapalhada na cozinha, mas ainda assim ficar gostoso. Dizem que Bethoven despendia de muito tempo para compor, num processo doloroso de reclusão; ao contrário de Mozart que sentava ao piano e a melodia brotava, e os dois foram gênios na arte de compor para a eternidade. Se fossem cozinheiros, suponho, dois chefs de peso e respeito da alta culinária, independente do processo de um ou outro em chegar à receita magnífica.

Até mesmo para cozinhar, tarefa muitas vezes pouco reconhecida, existe a questão da vocação, mas aventurar-se àquilo em que não nos sentimos hábeis também pode ser uma viagem deliciosa. Mesmo que a massa tenha ficado um pouco grudada, é experimentar o diferente, na esperança de um resultado no mínimo “digerível”.

Assim é a vida, em alguns momentos choramos ao cortar a cebola; em outros recebemos elogios depois de ficar mais de hora fazendo a massa à bolonhesa. Mas ao ouvir um pedido de repetição, tudo terá valido a pena. O “bicho-papão” da cozinha, ou de tudo o que nos assusta por pensarmos não dar conta, terá se transformado em um carinhoso ursinho de pelúcia, convidando-nos para o insólito caminho do aprendizado.

*Ana Cecília Romeu
*Publicitária e escritora

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