“Não vendo somente pastéis, vendo sonhos”

O aluno de Relações  Internacionais, Rafael de Castro Santos, sempre enfrentou de cabeça erguida todas as dificuldades vividas 

Pelas ruas da Fronteira, quem já não viu o jovem Rafael vendendo seus pastéis, com um sorriso estampado no rosto, uma mão segurando a caixa térmica com os pastéis e a outra segurando um livro, e não se perguntou quem é ele, o que faz em Livramento, de onde veio? Rafael é a prova de que apesar dos obstáculos, o ideal é não desistir dos sonhos, acreditando sempre que existe algo superior a guiar nossos passos. 

Recentemente, toda essa história de vida foi alvo de uma homenagem na Câmara de Vereadores, onde o estudante de Relações Internacionais recebeu o título de Cidadão Santanense Honorário, proposto pelo vereador Jansen Nogueira, em reconhecimento à lição de vida que é a sua trajetória até aqui. Intrigado com a repercussão do vendedor de pastéis e pelo seu carisma, que emocionou a todos na noite da entrega da medalha, o jornal A Plateia resolveu contar a história do estudante, vendedor de pastéis, que sonha ser embaixador do Brasil no Itamaraty.
Rafael de Castro Santos, 25 anos, natural de Jacundá, sudeste do Pará, filho único da professora Ana Cristina Dias de Castro, teve que enfrentar a separação dos pais já aos sete anos de idade, tornando-se, muito cedo, o homem da casa. Com ele, moravam a mãe, a tia e a avó.

Aos quatorze anos, com o sonho de ser jogador de futebol, participou de uma seletiva em sua cidade e foi escolhido um dos melhores jogadores entre 100 garotos que participavam da disputa. Foi para São Paulo e permaneceu na cidade por três longos anos. Morava em alojamento, e treinava muito até a exaustão. Mas mesmo depois de tanto sofrimento, não conseguiu jogar em um grande clube da elite profissional.

Durante sua jornada, Rafael reencontrou um amigo de infância e, no decorrer da conversa, se convenceu a voltar para Belém, onde jogou por três anos no Remo, clube de grande destaque da região. Porém, não saiu da categoria de base. Desiludido com o futebol, ele retomou seus estudos, e através do DESU (supletivo), concluiu o Ensino Médio aos 19 anos. Interessado pelo curso de Relações Internacionais, escolheu a cidade de Sant’Ana do Livramento para iniciar a sua formação acadêmica, devido à possibilidade de conseguir uma bolsa auxílio, que acabou não sendo obtida, pois a renda familiar deveria ser inferior a um salário mínimo e a da sua família totalizava um salário e meio.

Mais uma vez, longe de casa, da família e amigos, em outro estado, de costumes, cultura e valores diferentes, impressionado com o clima frio da Fronteira, o paraense não desistiu. Em fevereiro de 2010, estando há apenas um mês na cidade, começou sua história.

Após matricular-se na Unipampa (Universidade Federal do Pampa), como estudante de Relações Internacionais, mesmo sem a bolsa auxílio e sem recursos para subsistência, Rafael conheceu Gildo, pela internet, que lhe estendeu a mão, oferecendo um emprego como auxiliar na venda de pastéis. Rafael aceitou o emprego, e logo passou a dominar o assunto, fez amizade com os clientes, e rapidamente foi promovido. Começou, então, a vender pastéis sozinho, tornando-se popular em Livramento e em Rivera.

Determinado, em busca de um futuro melhor, o estudante sonha em ser Embaixador do Brasil, e diz que prestará prova para o Instituto Rio Branco, mesmo sabendo que não será uma tarefa fácil. O órgão do Governo Federal prepara o graduado para assumir a profissão de Diplomata no Itamaraty.

Ao jornal A Plateia, Rafael declarou: “Sempre pensei em ajudar, acredito que estou no caminho certo e não estou com pressa em apenas me graduar. Quero aproveitar ao máximo o conteúdo e as aulas, tendo assim uma base maior e melhor para a prova do Itamaraty. A previsão de formatura é para 2016. O tempo é algo muito precioso na minha situação e deve ser bem administrado, dou valor a cada segundo. Estudo no intervalo das vendas, durmo e acordo cedo para melhor otimização do tempo, e aproveitamento nos estudos. O conhecimento adquirido no curso é vital. É também de grande relevância exaltar a forma especial com que o povo santanense me acolheu, dando-me a oportunidade de autoconhecimento”.

Rafael conta que o maior obstáculo enfrentado até agora, na cidade, foi o inverno rigoroso. “A adaptação ao frio é complicada, ainda mais para quem não conhecia temperatura abaixo de 25ºC. Minha mãe veio me visitar e foi embora no dia seguinte”, contou ele.

O graduando e vendedor de pastéis é um vencedor. Não importa os obstáculos que enfrentou e que enfrentará pela frente. Ele já passou por muitas tempestades, dias nublados, e sempre se manteve em pé, direcionando os seus objetivos, planos e sonhos, para um lugar de vitórias. Energia, garra, otimismo, vontade e persistência, são suas palavras mágicas, com objetivo de traçar metas, e concretizar seus sonhos da melhor maneira. Ele é capaz de transformar o impossível no possível. Segue sempre em frente, sem medo. Força poderosa, influência bondosa e transformadora. Hoje, ele é uma referência positiva na sociedade. Sucesso Rafael de Castro Santos, em sua grande e vitoriosa trajetória.

Palavra do Coordenador do Curso de Relações Internacionais

Rafael Barladin, Coordenador do curso de RI da UNIPAMPA

O Coordenador Rafael Balardin declara que o estudante é um exemplo de aluno em vários sentidos. “Além das dificuldades enfrentadas em relação à separação do núcleo familiar, tem também o clima da região, que é muito diferente do Norte do Brasil. Ele busca por conta própria e esforço a manutenção econômica por meio do seu trabalho. Trabalho minucioso, no sentido que ele precisa atender bem as pessoas e criar bons relacionamentos. Ele traduz nos estudos e no trabalho o esforço e a objetividade que tem de se formar no curso de Relações Internacionais, prestar concurso para o Instituto Rio Branco e ser membro do Itamaraty, que é certamente o concurso mais difícil do Brasil. O concurso cobra exageradamente, de forma positiva, um conhecimento do Brasil e do mundo, isso faz com que o preparo seja desgastante e de longo prazo. O Rafael é um exemplo de obstinação desde que entrou na faculdade. Ele já estuda e se prepara para isso, e consegue conciliar com o trabalho. Se não bastasse isso, ele participa ativamente na sociedade, desenvolve alguns projetos e serviços voluntários relacionados a crianças e esportes, e consegue, dentro do tempo que tem, conciliando estudo e trabalho, se integrar à sociedade, com força de vontade de alcançar o seu objetivo, nunca em benefício próprio, sempre humilde. Quando se fala em investimento em educação, a médio e longo prazo, o Rafael é um exemplo de resultado imediato. Se não fosse essa vaga concedida a ele, Livramento não teria tido o prazer e a oportunidade de contar com ele, nas relações sociais. Ele é um guri que serve de exemplo para tantos outros alunos, tantas outras pessoas que estão em suas cidades, perto de seus familiares e ainda assim apresentam falta de bondade. O aluno Rafael tem um comportamento especial, sempre com livro na mão a perguntar e questionar, muito esforçado, estudioso, proativo, ótimo aluno e ótima pessoa. Ele ultrapassa a média e as expectativas que se criam em torno de um aluno. É gratificante e um prazer ter um aluno como Rafael na nossa instituição. Eu me emociono em falar sobre o Rafael”, concluiu o professor.

Como Gildo Paz Balsamo conheceu o  “Rafa”

Gildo Paz Balsamo empregou Rafael quando o estudante mais precisava

“Quando o Rafa chegou à cidade, começou a frequentar a igreja que eu frequento com minha família, e convivendo e conversando com ele, fiquei sabendo das dificuldades que ele vinha passando na cidade, por isso o convidei para trabalhar comigo, na minha empresa familiar, onde vendemos pastéis. Ele vinha passando muita dificuldade, muitas vezes não tinha sequer um real na carteira.

No início, o Rafa era muito inibido, tímido, e não conhecia ninguém na cidade. Quando via os professores e os amigos da faculdade, sentia vergonha. O tempo foi passando, e ele foi se descobrindo e se destacou, se superou, tornando-se o melhor vendedor que já tivemos. Ele tem um potencial e uma disposição incrível, que nós nunca vimos antes em ninguém. Ele criou suas próprias estratégias de venda, e hoje vende, em média, 500 pastéis por dia.

 

Rafael recebendo o título de Cidadão Santanense Honorário do vereador Jansen Nogueira

A primeira venda dele foi no estádio Atílio Paiva, em Rivera, no jogo do Peñarol contra o Inter. Ele era tímido, não era vendedor ainda, e a partir daí começou a se soltar. Encontrou uma professora que disse para ele vender na faculdade. Com a perda da bolsa auxílio, ele se viu sem saída, mas hoje se descobriu e se superou. Quando encontrou trabalho, viu que conseguiria realizar seu sonho. Ele é um rapaz honesto, disposto, trabalhador, amigo, solidário, e está sempre sorrindo.

Ele trabalha todos os dias da semana, inclusive aos domingos. Venceu preconceitos e barreiras. O Rafa que não tinha um real na carteira, hoje tem suficiente para ele e para ajudar o próximo. A gratidão é a semente do mais, e o Rafa tem gratidão por tudo e por todos. O Rafa é um vencedor, eu daria para ele um título de campeão. Venceu preconceitos e barreiras… O momento que ele está vivendo é um título de campeão. Ele é um vencedor.

 

Palavra da turma do Curso de Relações Internacionais da UNIPAMPA

O Rafael é muito estudioso, muito aplicado. Ele é um guri que trabalha e estuda ao mesmo tempo, não arranja problema com ninguém. Ele é um exemplo de pessoa e de aluno. Reduz a quantidade de matéria que pegará em cada semestre, para poder se dedicar ao máximo à cadeira, para esgotar o possível de conteúdo de cada assunto. Ele é um cara que é um exemplo para todos nós.

Para finalizar

Rafael é grato por todo o conhecimento que adquiriu ao andar pelas ruas de Livramento, interagindo com as pessoas e ganhando, com isso, o que nenhuma universidade poderia dar a ele, que é gratidão, força e coragem para nunca desistir. Hoje, ele se considera um paraense/gaúcho da Fronteira, um santanense de coração. 

Katyuscia Moura
katyusciamoura@jornalaplateia.com

Fotos - Marcelo Pinto

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2 Comentários

  1. RafaelSantos

    Olá Pessoal, só tenho a agradecer a todos vocês da fronteira. Os amo muito. Como digo, “Não é simplimente pastel, é o financiar de um sonho’.

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