Laje de obra desaba e deixa nove trabalhadores feridos

Maioria dos nove trabalhadores feridos já foi liberada pelos médicos, enquanto provável causa aponta para escoramento. Foto: Marcelo Pinto/AP

Fato ocorreu na manhã de sexta-feira, na edificação das novas instalações do campus local da Universidade Federal do Pampa

Os alunos de Administração e Relações Internacionais, bem como de outros cursos que participavam de cadeiras específicas na Unipampa, na manhã de ontem, levaram um grande susto. Assustaram-se também servidores, professores, funcionários e de terceirizadas.

Um estrondo que retumbou, reverberando som incomum no local da obra de edificação das novas instalações do prédio anexo do campus, foi o sinal de que algo inusitado ocorrera. Eram 8h40 de sexta-feira, 29 de novembro. Cerca de 15 trabalhadores operavam na concretagem de uma das lajes do segundo pavimento do prédio. O desabamento, mais do que o estrondo, deixou como saldo 9 trabalhadores feridos. Um deles, José Ricardo Silva Rangel, de 35 anos, o Zezé, permanecia na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI) da Santa Casa de Misericórdia até o fechamento desta edição. De acordo com o boletim médico das 18h30 de ontem, não havia risco de morte e o paciente registrava condição estável.

Rogério Arruda Silveira, trabalhador da obra, sendo atendido pelo soldado Farnei, dos Bombeiros. Foto: Marcelo Pinto/AP

As aulas da sexta-feira foram suspensas no campus Sant’Ana do Livramento. A universidade emitiu uma nota ao fim da tarde de sexta-feira, confirmando que como não houve qualquer dano ao prédio em uso para aulas, e não há circulação de alunos e servidores nas proximidades do local do acidente, na segunda-feira, 2 de dezembro, as atividades acadêmicas e administrativas do campus serão retomadas normalmente.

Por outro lado, segundo o engenheiro Jorge Sobrosa, diretor proprietário da empresa Sotrin Construtora, de Alegrete – responsável pela obra – a perícia técnica teve início ontem mesmo, sendo que a paralisação nos trabalhos deverá ser de até 30 dias. 

O cenário

O cenário, na manhã de ontem, na Andradas e Barão do Triunfo, no acesso principal e acesso lateral (junto ao ginásio de esportes Maristão), era de tensão e confusão.

“Desabou a segunda laje do prédio. Consegui sair e tirei um colega” – disse Régis, um dos trabalhadores na primeira abordagem realizada, cerca de 20 minutos após o fato, quando a equipe de reportagem da RCC FM – a unidade móvel número 1 – chegou ao local e começou a transmitir ao vivo, em primeira mão.

Ambulâncias do Corpo de Bombeiros (Resgate) e da Samu estavam no local, integrantes da Brigada Militar, trabalhadores correndo. A Guarda Municipal de Trânsito procurava bloquear o trecho da Andradas entre Barão do Triunfo e Thomaz Albornoz. Dois caminhões de Bombeiros, alguns veículos particulares e pessoas, curiosas, começaram a se aglomerar perto do portão lateral, ao lado do ginásio.

Uma equipe da Movilcor chega. Médicos, enfermeiros e socorristas se dirigem ao local. Há dúvida se alguém ainda estava sob a estrutura. O prefeito em exercício, Edu Olivera, foi até o local, onde conversou com o sargento Malheiros dos Bombeiros.

“Soubemos do incidente e estamos aqui para tentar dar um suporte, por meio da Secretaria de Saúde” – disse.

Nesse momento, houve evacuação do prédio da universidade.

Trabalhadores feridosAlexandre dos Santos Silveira, 24 anos
Paulo Roberto Marques Cremonini, 29 anos
Anderson Cleiton Marques Cremonini, 24 anos
Rogério Arruda Silveira, 32 anos
*Régis Dias Goulart, 53 anos
Valdecir Irala de Freitas, 46 anos
*Rafael dos Santos Silveira, 20 anos
Dioner Moreira de Freitas, 30 anos
José Ricardo Silveira Rangel, 35 anos

*Chegaram ao hospital por conta própria – sem necessidade de ambulância

Ao fundo, o trecho do segundo pavimento de laje que desmoronou na estrutura do anexo da universidade, em Livramento. Foto: Marcelo Pinto/AP

Provável falha no escoramento é indicada como causa do incidente

Passados os primeiros momentos, por volta das 10h40, e – oficialmente, em nota divulgada pela universidade à tarde –, foi indicado que, durante o lançamento do concreto, houve uma falha do escoramento, fazendo com que a equipe que trabalhava, juntamente com a estrutura em execução, caíssem de uma altura aproximada de quatro metros. “Apenas a perícia pode apontar se a falha no escoramento deveu-se à má execução, ou falta de resistência do material” – informou o documento.

Quatro médicos, inclusive o plantonista da UTI, foram atender, na Santa Casa, os feridos. O médico Carlos Moura disse que haviam sido levados cinco trabalhadores para a Santa Casa, os quais passavam por exames, pouco após as 9h30. “Quero tranquilizar, principalmente os familiares, que não há lesões de maior gravidade. Estão sendo realizadas radiografias e tomografias” – disse o médico. “Não há lesões neurológicas, estão todos conscientes” – reportou.

Segundo indicou a Unipampa, na nota, cinco operários da equipe que atuava na concretagem da laje tiveram ferimentos que exigiram o transporte de ambulância para o hospital Santa Casa de Misericórdia. “Um deles já foi liberado, enquanto os outros quatro permanecem em observação. Nenhum deles teve ferimentos considerados graves. Outros quatro operários procuraram o hospital Santa Casa de Misericórdia por conta própria, o que provocou a recontagem do número de feridos para nove pessoas. Esses quatro trabalhadores foram atendidos, medicados e liberados para casa” – informava a nota, ao fim da tarde. 

Regularidade 

“A obra está regular pelo que a Prefeitura exige. Vamos acompanhar. Dentro do que cabe fiscalizar, perante a prefeitura a obra estava de pleno acordo com as exigências da municipalidade” – disse Edu Olivera, confirmando a regularidade da obra. 

O momento do acidente 

“Não dá para descrever o momento do acidente. Caí de mais de 4 metros em queda livre. Foi muito triste” – disse Anderson Cleiton Marques Cremonini, 24 anos, um dos trab alhadores, preocupado com o irmão mais velho, Paulo Roberto Marques Cremonini, 29 anos, que, até o início da noite de ontem, permanecia internado.

A mãe dos trabalhadores, Noeli Lemos, estava muito apreensiva, pois de seus dois filhos, Paulo estava sob observação. Ao fim da tarde, ele foi levado para um quarto, também em situação estável.

Eva Rangel, chorando, e Vitor Rangel, mãe e irmão do trabalhador José Ricardo Silveira Rangel, 35 anos, estavam no hospital. A princípio, segundo Eva, seu filho, José Ricardo, havia sofrido ferimentos no rosto. Instantes depois, a médica Alina informava que havia possibilidade de lesão na coluna. Ao fim da tarde, o boletim médico dizia que o quadro de Rangel era estável.

“Estudo na sala 11, ouvi um barulho enorme e de imediato ouvimos alguém chamando por socorro, pelos bombeiros” – disse a estudante de Administração do diurno, Carine Frassoni.

O sargento Alves, do Corpo de Bombeiros, foi um dos vários militares do CRB, que atuou no atendimento. De início, havia preocupação em função da listagem da empresa indicar que 28 pessoas trabalhavam naquele momento. “Fizemos uma varredura e verificamos que havia 9 acidentados, porém, seis deles foram deslocados em ambulâncias” – referiu. 

Arquiteta Ana Luisa Santana, engenheira civil e engenheira de segurança da Sotrin Eduarda Trindade, e o engenheiro da obra Jorge Sobreosa, dono da Sotrin

A versão da empresa responsável 

Como se trata de uma laje em execução, não há vício na obra, segundo o engenheiro Jorge Sobrosa, diretor da empresa responsável pela construção, a Sotrin Construtora. A paralisação não será, conforme ele, superior a 30 dias. “Às vezes, foge do controle, mesmo com toda preocupação em segurança. Nossa primeira preocupação foi com os nossos trabalhadores. Graças a Deus, nenhum quebrou nada, nenhum sofreu fratura” – disse o dono da empresa.

Questionado sobre os motivos, afirmou que seria necessário um trabalho pericial. “É cedo para se dizer alguma coisa. Se nota a cedência de escoramentos. Essa obra é diferenciada, estamos fazendo com formas de poliometano, mais leves e todo o escoramento metálico – que geraria mais segurança -, mas o escoramento não suportou e a laje, que estava sendo concretada e não tinha resistência alguma, cedeu. Não é nada com a estrutura do prédio” – disse Sobrosa.

“Não se trata de estrutura. Essa laje caiu sobre uma outra laje, que havíamos con

cretado há pouco mais de 30 dias e que resistiu perfeitamente. Devíamos ter, em cima dessa laje, em torno de 250 toneladas de concreto, 175 metros cúbicos” – disse.

A ideia, conforme Sobrosa, é não causar atraso na obra, cujo prazo de execução é de 28 meses, dos quais 8 já passaram. “Vamos tentar manter o prazo, que é uma das condições, pois nossa empresa tem 35 anos e esse é o primeiro acidente em obra que temos. Temos solidez e condição de recuperar esse prazo” – referiu Sobrosa. 

Investimento de R$ 10,5 milhões 

A obra de construção do anexo da universidade, iniciada há 8 meses, é um investimento de cerca de R$ 10,5 milhões em Livramento. De acordo com a Unipampa, todos os procedimentos legais referentes à notificação do incidente foram realizados pela empresa e pela Universidade, incluindo registro do fato em boletim de ocorrência na Polícia Civil, solicitação de perícia, e comunicação do acidente de trabalho ao Ministério do Trabalho. A comunidade acadêmica do Campus Sant’Ana do Livramento também receberá esclarecimentos sobre o fato, de acordo com a direção do campus.

O engenheiro André Lubeck, pró-reitor adjunto, responsável pela Coordenadoria de Obras, Manutenção e Projetos, disse que a primeira avaliação realizada pela equipe técnica da Unipampa leva a crer que a estrutura já executada do prédio anexo não foi afetada pelo desabamento da laje, mas a estrutura terá de passar por novas avaliações técnicas e legais nos próximos dias. Todos os operários estavam usando equipamentos de proteção individual. “O projeto permanece tal qual foi elaborado. Fui com o engenheiro Tiago e a fiscal Helena fazer uma vistoria e não há necessidade de qualquer alteração no projeto original” – referiu. “A obra está perfeitamente regular. Conta com trabalhadores legalizados, engenheiro de segurança. O que ocorreu foi uma falha no escoramento. Não sabemos ainda a razão” – disse ele.

A diretora do campus em Livramento da Unipampa, professora Daniela Benetti, tranquilizou a comunidade acadêmica e também os santanenses. Assim como as aulas serão normalizadas na segunda, 2, há a tendência de que na mesma data outras frentes de serviço da edificação possam ser retomadas pelos trabalhadores, sendo isolada a área do incidente até o fim da perícia. “Podemos retomar nossas atividades em sala de aula e administrativas do campus já na segunda-feira” – referiu. “Quero acalmar toda a comunidade e os pais de nossos estudantes. Tanto servidores, quanto alunos, estão todos bem” – disse. 

Expectativa 

A arquiteta Luisa Santana, responsável pela orientação aos mestre de obras, e a engenheira civil e engenheira de segurança da Sotrin, Eduarda Trindade, realizaram vistoria na área e já providenciaram os relatórios iniciais.

Técnicos da área de engenharia da Secretaria do Planejamento, assim como do Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura (CREA), foram até o local. Em função de todos os procedimentos e autorizações estarem rigorosamente regulares, não houve manifestação desses fiscais técnicos.

Para apontar os motivos, agora, somente os laudos técnicos.

 

HENRIQUE BACHIO
henriquebachio@jornalaplateia.com

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