Espinhaço de Ovelha: uma iguaria santanense

A convite do jornal A Plateia, o cheff Paulo Castro elaborou a receita que foi destaque na revista “Tam nas Nuvens”

Espinhaço de Ovelha, típico da Fronteira

 

Quem for viajar durante o mês de janeiro pela TAM, seja de férias ou a trabalho, seja brasileiro ou estrangeiro, poderá conferir a bordo uma matéria que destaca Sant’Ana do Livramento, veiculada na Revista “Tam nas Nuvens”, distribuída para passageiros da companhia aérea. Esse foi o caso do casal Kamal Badra e Jeanine Duarte Badra, que em recente viagem ao Rio de Janeiro tiveram a oportunidade de ver a cidade natal reconhecida a nível internacional.

A revista, com publicação bilíngue, traz durante este mês, em uma de suas matérias, um pouco da culinária brasileira, com uma abordagem diferente, apresentando pratos que não são costumeiros, mas únicos em cada região. A lista com os 10 pratos Top do Brasil, considerados os clássicos regionais, aguça o paladar dos passageiros e cria um estímulo para que eles caiam na estrada e conheça mais sobre a gastronomia brasileira e os lugares onde eles são tradicionais. E o prato escolhido para representar Sant’Ana do Livramento foi o, único e tradicional, Espinhaço de Ovelha, ranqueado em 4º lugar na Top Lista dos Sabores do Brasil da Revista “Tam nas Nuvens”.

 

 

Aproximadamente 3milhões de brasileiros com perfil altamente qualificado estão a bordo da Tam mensalmente, com disponibilidade de tempo para ler a revista a bordo, e que em janeiro ficarão conhecendo um pouco mais de Sant’Ana do Livramento. Sabendo disso, a equipe de reportagem do jornal A Plateia entrou em contato com o Cheff Guilherme Tse, do restaurante Ecully, de São Paulo, que elaborou os pratos, e também com o repórter Victor Gouvêa, que escreveu a matéria. E, em Livramento, convidou o Cheff Paulo Castro para elaborar e ensinar a receita do tradicional Espinhaço de Ovelha da Fronteira para os leitores.

 

A escolha do Espinhaço

Repórter da Revista “TAM nas Nuvens”, Victor Gouvêa, por e-mail, relatou como foi realizada a matéria e como chegou à escolha do prato santanense. Ele contou ao jornal A Plateia que quando decidiu fazer a pauta sobre pratos típicos e desconhecidos e separados por regiões, a gastronomia do Rio Grande do Sul era uma promessa de bons frutos. “Pensei, cá comigo, que em São Paulo só conhecemos mesmo o churrasco, e meu faro jornalístico e glutão me indicava que nos Pampas haveria pratos típicos (ou preparações específicas, talvez) desconhecidos”. Victor contou que na primeira pesquisa feita pela internet, em algum site viu mencionado o espinhaço, sem apontar uma cidade específica. Então, o jornalista decidiu confiar nessa intuição e pesquisou mais sobre o prato. “Decidi ligar para a Associação Brasileira dos Criadores de Ovinos, e ao falar com o presidente, ele me indicou que este era um prato comum em Sant’Ana do Livramento, um lugar onde se poderia prová-lo, destacando que a cidade é uma das maiores produtoras de ovinos do Brasil”. Assim, segundo ele, foi passada a referência para a equipe do restaurante Ecully, de São Paulo, que seria responsável pela preparação dos pratos para a seção de fotos. “Mas não pense que era comida cenográfica não! Mandamos tudo pra dentro, incluindo o espinhaço (eu, a produtora, o fotógrafo e o diretor de arte)”, informou o repórter.

Victor destacou que em São Paulo a equipe do Ecully teve dificuldade de encontrar o corte específico do espinhaço, e por isso a receita foi adaptada. “Então não posso dizer que provei propriamente o espinhaço de ovelha gaúcho, pois a carne era de outro corte, apesar da preparação ser igualzinha”. Questionado pela reportagem se conhecia o Rio Grande do Sul e a sua culinária, Victor contou que viajou recentemente ao Estado, mas não conseguiu provar o prato típico de Sant’Ana do Livramento. “Agora, no recesso de fim de ano, viajei até o Uruguai de carro, passando pelo Rio Grande do Sul inteiro, incluindo Porto Alegre, Pelotas e Chuí. Confesso que todo cardápio que abria, dava uma olhada pra ver se encontrava um espinhaço de ovelha pra provar, mas não encontrei nenhum. Tinha que ter ido pra Sant’Ana mesmo (risos)”, finalizou Victor.

 O verdadeiro sabor da Campanha

O cheff de cozinha, Paulo Castro

Convidado pelo jornal A Plateia para elaborar o verdadeiro Espinhaço de Ovelha, Paulo Castro contou que trabalha com gastronomia há dezoito anos. Em 1995, ele foi para Porto Alegre, onde trabalhou no restaurante do Hotel Umbú. De lá, foi direto para o Hotel Bertelli, no Chuí. Em Livramento, realizou um tour pelos renomados restaurantes da cidade, tendo trabalhado por 7 anos no Solar D. Pedro Eventos e 10 anos no Verde Plaza Hotel e Centro de Eventos. Com orgulho, Paulo destacou sua participação no Programa Anonymos Gourmet, da TV COM, com José Antonio Pinheiro Machado, e no evento do Clube Comercial, com o renomado Cheff João Del Puppo e o Global Galvão Bueno. Há 5 anos, durante a Semana Farroupilha, ele é o responsável pela cozinha do Movimento Nativo Coxilha de Santana, onde além de preparar comidas típicas do Estado, prepara pratos com carne de ovelha, como o Espinhaço de Ovelha, Arroz de Esquilador e a Paella Campeira. O Cheff ainda realiza palestras motivacionais para merendeiras da rede estatual e municipal de ensino, sempre fazendo questão de elaborar um prato de ovelha, bem sugestivo da região.

Katyuscia Moura experimentou o prato pela primeira vez e aprovou

Paulo Castro elaborou o prato em cerca de uma hora, utilizando o corte tradicional: a espinha. Ele ressaltou que esse é um prato que poderia ser melhor aproveitado turisticamente, pelos restaurantes do município, pois é de fácil preparo, uma carne macia e saborosa. “Ainda mais, que Livramento é um dos maiores produtores de ovinos do País”, lembrou.

A equipe de reportagem acompanhou o processo de elaboração do prato, na casa do diretor de A Plateia, Antonio Zuheir Badra, e, claro, provou a iguaria santanense. Katyuscia Moura, editora chefe do jornal, é capixaba e mora há pouco mais de dois anos na cidade e salientou que ainda não havia provado nada à altura deste prato aqui na região. “O sabor é único, nunca tinha comido carne de ovelha. Aprovei o prato, e o cheff Paulo Castro mostrou que sabe fazer uma boa comida campeira”, avaliou.

 

 

 

Ingredientes para fazer o Espinhaço de Ovelha:


- 3,0 kg de espinhaço de ovelha,
-1,5 kg de mandioca,
- 2 maços de tempero verde,
- 1 cabeça de alho,
- 4 cebolas médias,
- 2 tomates,
- 30 ml de óleo e Sal e pimenta a gosto.

Tempo de cozimentoCerca de 1h30
Quanto Custa: R$ 60,00
Serve quantas pessoas: 10
Grau de dificuldade de preparar o prato: Médio

 

História do Espinhaço de Ovelha

O Arroz de Esquilador pede um bom vinho Tannat

Um dos pratos mais populares da culinária campeira do Rio Grande do Sul, especialmente nas regiões da Campanha e da Fronteira Oeste, onde estão os grandes campos nos quais pastam milhares de bovinos e ovinos, é o chamado Arroz de Esquilador, que alguns também identificam como Espinhaço de Ovelha, neste caso elaborado com outros ingredientes, que não o arroz: mandioca, batata, farinha, etc.. O Arroz de Esquilador, segundo a lenda, nasceu nos galpões das grandes estâncias, quando a ovelha era uma importante riqueza da região, graças à valorização da lã, e a época da tosquia, na Primavera, reunia, em alguns casos, dezenas de homens, para tosar os grandes rebanhos, cuja lã tinha bom preço e, muitas vezes, pagava todas as despesas do ano e ainda deixava lucro ao fazendeiro.

No início, se fazia a tosa a martelo, com uma grande tesoura de aço manuseada com rapidez. Depois, veio a máquina de tosar, que diminuiu o número de homens necessários, mas, mesmo assim, ainda exigia grande mão de obra. Em ambos os casos, era preciso trabalhar com muita rapidez. Primeiro, porque a quantidade de animais era muito grande; depois, porque o patrão tinha pressa para mandar a lã para as barracas, na cidade, e, finalmente, porque podia chover e os animais, recém tosados, não podiam receber água direto no corpo nu porque morriam.

Esta rapidez exigia que os homens não parassem as tesouras nem para comer. Então, precisavam fazer uma comida simples e rápida. E nada mais adequado para isso do que encher um panelão com água, sal e temperos e jogar dentro pedaços de carne de ovelha que ficavam fervendo até ficarem macios e quase largarem do osso. Quando chegava neste ponto, era só acrescentar o arroz e cuidar para que não cozinhasse muito. Quando estava al dente, era só servir, inclusive com algum caldo, para molhar e amolecer a bolacha cabeça-de-anjo, que era uma verdadeira pedra. O longo tempo para ferver a carne também se explica. Como, na época, o que interessava era a lã das ovelhas e não a carne (valorizada hoje), os fazendeiros deixavam as ovelhas envelhecerem no campo – 3,4,5 anos – para obterem mais lã todos os anos. Só abatiam os animais velhos, quando já não produziam tanta lã, e esta era carne que ia para consumo, portanto, com o característico cheio forte da olhe e carne dura. Tinha que ferver muito para soltar do osso e ficar gostosa.

Na minha infância e juventude, nos campos do São Diogo, às margens dos rios Ibirapuitã eIbirapuitã Chico, foi que aprendi a preparar o Espinhaço de Ovelha e o Arroz de Esquilador. Muito suei, também, dentro das bolsas de lã penduradas numa trave do galpão, pulando para acamar os velos, serviço terrível, diante do calor da época, mas melhor do que agarrar as ovelhas, capões e carneiro, no muque, na mangueira, para trazê-los para os esquiladores. Quando eram da raça Merino Australiano era relativamente fácil, porque eram animais de pequeno porte, mas, depois, a família optou pelo Corriedade e eram um bichos enormes, pesados, com sacos afiados que cortavam os pés calçados com alpagartas Roda.

Dito isso, vamos à receita de Arroz de Esquilador, como está no meu primeiro livro, “Cordeiro na Mesa”, publicado em 1998, numa homenagem ao jornalista Adalberto Moacir de Menezes Jardim, meu parceiro de muitas cozinhadas, pesquisa de receitas e amante da carne de cordeiro. Para quatro pessoas: oito pedaços de espinhaço; 1,5 xícara de arroz; duas cebolas; dois tomates; uma cabeça de alho, sal e pimenta a gosto, óleo suficiente para fritar. Frite as carnes com a cebola, o alho e o tomate. Cubra com água e deixe ferver por meia hora ou mais, até que a carne comece a se desprender dos ossos. Acrescente o arroz (e mais água, se for necessário) e em 10/15 minutos estará pronto. Coma quente, com o arroz al dente, bem molhado. Os uruguaios gostam de acompanhar com um pão francês novinho e crocante. Para beber, escolha um bom tinto de sua preferência. Eu, como sou meio bairrista, sempre escolho um Tannat Amat, do Javier Carrau, ali no Cerro do Chapéu, em Rivera, e um Tannat Vinhas Velhas, da Almadém, lá do Cerro de Palomas, cuja produção muito solicitei ao Adriano Miolo, aproveitando as vinhas com mais de 35 anos plantadas pela National Distillers, em Palomas.

Por Danilo Ucha
daniloucha@terra.com.br 

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